A Guilda dos Aventureiros da Cidade Sagrada estava em alvoroço com os rumores sobre Luciel, também conhecido como “Santo Esquisito”, o único curandeiro que colocava a compaixão acima do lucro.

Já fazia meio ano desde sua última visita ao salão da guilda. Muitos aventureiros lembravam-se dele dizendo que ficaria afastado por um tempo e até o viram estocando enormes quantidades de comida e de Substância X, mas ele simplesmente desapareceu sem deixar rastros.

No início, pensaram que ele só tinha saído em uma viagem, mas ninguém conseguia confirmar seu destino. Não fazia sentido um curandeiro do seu nível acabar em um lugar sem uma Guilda dos Aventureiros, já que praticamente toda cidade tinha uma. Além disso, teria havido registros de pedidos da Substância X onde quer que ele estivesse.

A Substância X era absolutamente repulsiva, e ninguém em sã consciência beberia aquilo por vontade própria. Por isso, a Sede da Guilda dos Aventureiros oferecia incentivos anuais—prêmios que vinham diretamente da herança de um sábio há muito falecido e do antigo mestre da guilda—para a filial que consumisse mais daquilo. As classificações eram visíveis em todas as filiais da guilda. Os números eram rastreados por algum mecanismo absurdamente avançado, que descontava qualquer substância descartada para evitar trapaças. Não que houvesse muitos corajosos o bastante para tentar burlar o sistema, já que corria o boato de que, se alguém jogasse fora a Substância X, de alguma forma ela voltaria para sua boca.

Ninguém havia consumido a Substância X regularmente em anos... até que certo alguém começou a entorná-la sem parar na filial de Merratoni. Da mesma forma, quando Luciel se transferiu para a capital, o consumo local disparou. Então, onde quer que ele estivesse, deveria ser fácil rastreá-lo. Não havia dúvidas de que ele ainda estava na Cidade Sagrada... e, no entanto, ninguém conseguia encontrá-lo.

Normalmente, isso não seria um grande motivo de preocupação, mas sem o Santo por perto para impedir a exploração desenfreada, as clínicas começaram a se sentir confiantes o bastante para inflacionar seus preços ainda mais. Petições foram enviadas à Igreja, mas nenhuma foi respondida.

Até que alguém soltou:

— E se a Igreja o trancafiou?

Então, as teorias começaram a se espalhar como fogo em palha seca.

— E se estão torturando ele?

— Ele deve estar sendo lavado cerebralmente!

— Vai ver só estão dando Substância X pra ele comer.

— E se já mataram ele?

A inquietação logo se espalhou dos aventureiros para os cidadãos. A desconfiança na Igreja cresceu e, rapidamente, um movimento para salvar o Santo Esquisito começou a tomar forma.

***

Enquanto isso, na Igreja, alguns começaram a se preocupar com a prolongada estadia de Luciel no labirinto. Seus amigos próximos sabiam que ele costumava desaparecer por um mês ou mais de cada vez e acreditavam que ele retornaria logo. Mas um mês se passou, depois outro... e mais outro... e Luciel continuava sumido.

A própria papa—sua superior direta—junto com Cattleya, anteriormente conhecida como Lady Catherine Frena, capitã dos cavaleiros, tentaram organizar uma unidade de resgate. Como era de se esperar, a ideia foi rejeitada. A Igreja não podia gastar seus recursos limitados para recuperar um único curandeiro perdido em um labirinto de cinquenta anos.

Os colegas de Luciel criticaram sua imprudência, chamando-o de arrogante por achar que poderia conquistar o labirinto sozinho. Somente graças aos esforços de Sua Santidade, de Cattleya e das Valquírias, ele não foi oficialmente condenado e seu nome permaneceu protegido. Em troca, qualquer plano formal de resgate foi descartado.

Após meio ano desde o desaparecimento de Luciel, aventureiros começaram a exigir respostas sobre seu paradeiro, mas a Igreja se recusou a comentar. A verdade sobre o labirinto precisava permanecer oculta, mesmo que isso significasse esconder o destino do jovem curandeiro. Caso a Igreja o declarasse morto, o povo exigiria um corpo. E, então, os tumultos começariam.

Enquanto tudo isso acontecia, a única unidade de cavaleiros preocupada com o sumiço de Luciel—As Valquírias—se preparava para iniciar uma busca. Com a companhia de seu predecessor nada entusiasmado, Jord, partiram rumo ao labirinto. Sua força combinada era impressionante, e o regimento rapidamente deu cabo das hordas de esqueletos e zumbis na sala do chefe do décimo andar.

Ao mesmo tempo, Luciel enfrentava o clímax de sua batalha contra o cavaleiro lich. O que nenhum dos dois lados sabia era que as portas dos chefes estavam interligadas. Enquanto alguém estivesse enfrentando um chefe em um andar superior, as portas de um andar inferior permaneceriam trancadas.

As Valquírias haviam acabado de recolher suas pedras mágicas quando Luciel, a contragosto, desceu até o quadragésimo primeiro andar. A unidade de resgate continuou seguindo seu rastro, e o cheiro pútrido só aumentava. Eles mal conseguiram passar do trigésimo andar quando a magia negra dos espectros começou a afetá-los. Incapazes de suportar os ataques frenéticos e distorcidos que começaram a desferir uns contra os outros, as Valquírias foram forçadas a recuar.

Lumina e sua unidade emergiram e estavam relatando a situação para Cattleya quando as tensões finalmente explodiram. A Sede da Igreja estava cercada—liderando um grupo de aventureiros de Merratoni estava ninguém menos que o mestre da guilda, Brod.

Grantz e seu grupo de aventureiros haviam se juntado a eles, junto com cidadãos de todas as origens que deviam favores ao jovem curandeiro. Juntos, eles gritavam em uníssono:

— Libertem o Santo Esquisito! Acabem com a ganância!

E seu número só crescia.

A Igreja nunca havia enfrentado uma crise assim, uma manifestação de proporções épicas. O protesto estava a um passo de se tornar um motim. Seus cento e oitenta cavaleiros preguiçosos tremiam diante de centenas de aventureiros endurecidos pela batalha e milhares de cidadãos furiosos que lotavam seus portões. A qualquer momento, o estopim poderia ser aceso.

Luciel, alheio a tudo isso, estava lentamente chegando ao fim de sua árdua jornada. Mal sabia ele que, ao retornar à superfície, se encontraria mais próximo da morte do que jamais estivera dentro do labirinto.