Nageki no Bourei wa Intai shitai | Let This Grieving Soul Retire Volume 04 – Capítulo 0 [Prólogo: O Sempre Confiável Mestre]



 — Krai, recebemos uma nota de agradecimento da Casa Gladis...

— Mmm, ah, só deixa ali no canto.

— Certifique-se de dar uma olhada nela em algum momento, ok?

Já fazia uma semana desde a inesperada confusão que foi o Leilão de Zebrudia. Eu estava trancado no escritório do mestre do clã, desfrutando da tranquilidade, quando Eva trouxe um envelope ricamente adornado. Olhei para o envelope e imediatamente desviei o olhar ao confirmar que carregava o selo da Casa Gladis.

Recentemente, eu tinha batido de frente com Éclair Gladis, a filha do Conde Gladis. Graças ao vínculo que Ark e eu compartilhamos, nossa disputa pela Relíquia foi resolvida de forma bastante pacífica, sem grandes danos ao nosso relacionamento com Éclair ou com o Conde Gladis.

Não poderia ter sido uma resolução melhor e, para mim, isso deveria ter sido o fim da história. No entanto, ao contrário dos caçadores, nobres e comerciantes não perdem tempo para te enviar uma carta, e isso era algo de que eu poderia muito bem viver sem.

Soltei um breve e profundo suspiro. Não que houvesse qualquer razão para eu receber uma nota de agradecimento, mas não estava rápido demais? Eu ainda nem tinha me recuperado da fadiga da última confusão. Eu só queria descansar.

Já havia uma pilha de cartas não lidas sobre a mesa na sala do mestre do clã. Como resultado do meu alto nível, eu estava recebendo cada vez mais cartas por dia, chegando a um número assustador.

Principalmente depois que assumi o papel de mestre do clã e quase parei completamente de sair da capital, comecei a ser soterrado por cartas. Cartas pedindo algum tipo de ajuda, convites, notas de agradecimento, desafios, currículos... Eu estava atolado em correspondências que não queria receber e nem sabia o que fazer com elas.

Eu sabia que tinha que olhar essas cartas em algum momento, mas, de alguma forma, minha mão simplesmente não chegava perto da pilha. Eu sou do tipo que adia as coisas o máximo que pode. Como eu tinha negligenciado demais, Eva começou a abrir e até responder algumas por mim.

Mas isso melhorou a reputação do clã, então achei que fiz bem em deixá-la cuidar disso.

— Ah, eu também estou ocupado...

— Eu não me importo de lidar com correspondência endereçada ao clã ou ao seu grupo, mas não gosto da ideia de abrir algo endereçado especificamente a você — disse Eva. — Posso acabar vendo algo confidencial...

Isso não iria acontecer. Eu não escondia nada de Eva. Ela deveria saber disso depois de passar tanto tempo ao meu lado.

Se havia uma coisa boa que podiam dizer sobre mim, era que eu não guardava segredos. Eu confiava tanto em Eva que até a deixava carregar o selo do clã.

Dei de ombros e Eva apenas suspirou. Ela olhou para a pilha de cartas que se acumulou, mesmo depois de filtrar apenas as mais importantes para mim, e começou a falar num tom mais rápido que o normal.

— Parece que Lady Éclair... gostou muito do bolo que você ofereceu.

— Mas é claro que sim!

Eva não respondeu.

Ah, é verdade, acho que havia mais uma coisa boa que podiam dizer sobre mim. Assenti com confiança.

Não querendo me gabar, mas eu conhecia todos os cafés confeitarias da capital. Não importava o estilo ou a variedade, eu já tinha visitado cada um deles. O único café que eu não conhecia muito bem era aquele que Eva mencionou antes, localizado no distrito decadente.

Eu tinha total confiança no bolo que dei ao Ark. Era um lançamento de uma confeitaria que eu tinha descoberto com carinho quando cheguei à capital. A loja ficava nos arredores da cidade, então, na época, não tinha muitos clientes. Agora, havia filas constantes, e sempre existia o risco de esgotar antes da sua vez.

O atendimento e a comida eram um dez de dez e eu conhecia pessoalmente o dono. Eu podia não saber recomendar uma boa loja de armas, um campo de treinamento ou um informante, mas podia encontrar a confeitaria perfeita para você.

Lady Éclair era uma nobre, mas bons doces exigiam mais do que apenas ingredientes de alta qualidade.

Ainda assim, para até mesmo a filha de um conde ficar impressionada com a minha seleção... Senti que meu talento estava sendo reconhecido pela primeira vez em um bom tempo, e isso me deixou muito feliz. Talvez fosse porque estavam acostumados a ingerir substâncias venenosas, mas os caçadores pareciam ter o paladar entorpecido e seus gostos nunca combinavam com os meus.

Percebi que Eva estava me olhando e rapidamente pigarreei.

— É, eu não sou muito chegado em doces, mas não tem nada sobre essa cidade que eu não saiba.

Que tal essa para um autêntico durão?

— ...Sim, de fato.

Agora espera um pouco, pensei. Parece que arranjei uma nova companheira de bolos. Eu achei que ela fosse uma nobre esnobe, mas pelo visto ela tem um paladar refinado. Não posso arrastá-la comigo como faço com a Tino, mas espero que pelo menos me apresente algumas lojas voltadas à nobreza.

Mas estou me desviando do assunto.

Decidi lidar com todas as cartas sobre a minha mesa.

— Apenas responda essas cartas de forma que não incomode ninguém. Recuse todos os pedidos e convites. Eu sou um homem ocupado, sabe.

Eva me lançou um olhar frio.

"Ocupado". Que palavra conveniente.

Eu me sentia mal recusando as cartas sem nem olhar, mas ler textos me dava sono. Sem contar que nobres e comerciantes só usavam expressões formais e rebuscadas, e, sinceramente, eu mal conseguia entendê-las. Deixar isso para minha excelente vice-mestre de clã era a melhor forma de garantir uma solução tranquila.

Eu não queria me envolver em disputas de poder mesquinhas e lidar com comerciantes ardilosos era assustador. Quando as cartas começaram a chegar, achei que parariam se eu simplesmente as ignorasse, mas isso claramente não estava funcionando. Eu poderia resolver tudo sozinho, mas continuei arranjando desculpas.

Idealmente, queria que Eva lidasse com todas as cartas, mas parecia que a resposta dela seria um não definitivo. Eva, que conhecia minha agenda melhor do que eu, franziu a testa.

— Mas sua agenda está vazia — disse ela.

— É necessário descansar de vez em quando. E, além disso, você não acha que estão enviando cartas demais para um único caçador? Os outros de Nível 8 estão todos tão ocupados assim? Achei que passassem a maior parte do tempo em cofres de tesouro...

— Falando nisso, Sven tem exigido que você faça algo sobre o Drink.

— Diga a ele para valorizar a criatura.

Lidar com monstros é mais a área do Sven do que a minha. Vou conversar com a Sitri sobre isso na próxima vez que a vir.

Soltei um grande bocejo, e um quebra-cabeça completamente branco, emoldurado e montado na parede, entrou no meu campo de visão. Pedi ajuda à Eva para terminá-lo. Depois de concluí-lo, era esperado que você desenhasse sua própria imagem nele, mas essa parte parecia muito trabalhosa na época.

— Ah, certo. Eu também preciso desenhar algo no quebra-cabeça. Hmmm, nem sei por onde começar... Isso não vai ser fácil.

Olhei fixamente para o quebra-cabeça. Eu não tinha habilidades artísticas, minha imaginação era patética e eu nem sequer tinha ferramentas para desenhar ou pintar. Nem sabia por que comprei um quebra-cabeça branco. Quanto mais pensava nisso, mais queria dar um tapa em mim mesmo do passado.

Eu estava franzindo a testa e inclinando a cabeça quando Eva decidiu mudar de assunto.

— Isso me lembra, Krai, ainda sobraram algumas fatias do bolo que servimos para Ark.

— Hã? Oooh, eu tinha esquecido disso. Quantas fatias?

— Duas. Eu as coloquei na geladeira.

Talvez o quebra-cabeça possa esperar... Não é como se alguém fosse morrer se eu não fizesse isso imediatamente.

Meus pensamentos agora estavam no bolo. Duas fatias... não dá para fazer muita coisa com apenas duas. Eu servi uma fatia para Ark e outra para Éclair, comi uma e dei outra para Eva. Restavam duas fatias.

Era um novo produto lançado no outono passado, e eu não fazia ideia de quando poderia provar novamente. Que dilema.

Esse não era momento para ficar sentado lendo cartas. Eu poderia dar o bolo para Liz e Sitri, mas elas não gostavam de doces. Na verdade, quase todo caçador não tinha paladar para sabores adocicados e refinados.

Pensei e pensei, e no final fiz o que sempre fazia: desisti porque me cansei de pensar.

— Tino. Quem mais senão Tino? — disse eu.

— Quem mais senão Tino?

Que mestre bondoso eu era. E durão também.

De todos os caçadores que conhecia, Tino era uma das poucas que compartilhava meu apreço por doces. Duas fatias restantes de um novo produto. Você poderia dizer que essa situação aconteceu especificamente para Tino.

Uma fatia para mim, uma para Tino. Tudo estava em perfeita harmonia. Tino ficaria feliz, e eu ficaria contente por compensar todos os problemas que Liz e os outros lhe causavam. Eu me sentia mal por Tino, ela sempre parecia estar em algum tipo de sofrimento.

Hoje estou inspirado.

— Desculpe, Eva, mas você poderia embrulhá-las para mim? Vou levá-las para a casa da Tino.

— Hã? Agora?

Ah, Eva, você não entende nada. Se eu não me apressar, o bolo perderá o sabor!

Eva pareceu notar minha exasperação e rapidamente corrigiu sua postura.

— Entendido. Será só um momento.

Ela não precisava ser tão rápida. Eva era uma indivídua excepcional, mas sempre levava tudo a sério demais.

Eu estava saindo, o que significava que queria alguma proteção, mas infelizmente Liz não estava em lugar nenhum quando eu precisava dela. A casa da Tino não era tão longe, no entanto, e eu não achava que haveria muitas pessoas por perto.

Pela primeira vez em um tempo, me preparei para sair e deixei a sede do clã com um salto no passo enquanto Eva me via partir.

Tenho me mostrado um desastre ultimamente. Talvez, pela primeira vez em um tempo, eu possa mostrar à Tino o quão atencioso sou.

***

— Entendeu, T? Se você está se sentindo mal, é por causa da sua própria falta de força. Seja por falta de experiência ou talento, se treinar o suficiente, não vai se sentir assim!

— S-Sim, Lizzy, mas...

— Nada de “mas”! Nem um! Quantas vezes eu já disse isso? Quantas vezes preciso repetir até você entender?

Olhos brilhando como chamas dançantes olhavam para Tino.

Sua mentora, Liz Smart, era ainda menor que Tino, mas quando as duas ficavam cara a cara, Tino sempre se encolhia.

Elas estavam na sala de estar da casa de Tino, mas Liz, sentada confortavelmente com as pernas cruzadas, parecia mais a dona do lugar. Na verdade, a casa que Tino alugava era um dos locais onde Liz ficava quando estava na capital. Por isso, Tino tinha duas camas, cadeiras e conjuntos de talheres, mesmo sendo tecnicamente a única residente da casa.

Liz se recostou na cadeira e mexeu em um pequeno baú do tesouro do tamanho da palma da mão. Ela inseriu uma gazua em forma de agulha na fechadura e a moveu com delicadeza. Empilhados sobre a mesa estavam outros baús com fechaduras de diferentes formatos. Esses eram usados pelos Ladinos para praticar arrombamento.

Quando um baú era encontrado em um cofre de tesouro, era trabalho do Ladino abri-lo. Um único baú podia conter diversos itens, por isso caçadores consideravam uma grande sorte encontrar um.

— Toda adversidade pode ser considerada um teste. Quem só foge das dificuldades continuará um fraco, não importa quanto tempo passe como caçador. As pessoas crescem superando desafios! Se tem reclamações, guarde-as até fazer o que precisa ser feito!

Liz jogou o baú do tesouro sobre a mesa. Tino rapidamente pegou o baú, que se abriu em suas mãos sem fazer um único som.

— Se está sofrendo agora, é o que você merece por ter relaxado antes. Pelo menos aprenda a arrumar sua bagunça!

Tino achou aquelas palavras sábias. O treinamento de Liz era intenso e assustador, mas ela não guardava ressentimento, pois sabia que sua mentora era ainda mais rígida consigo mesma. Mesmo que não demonstrasse, levaria mais do que talento natural para se tornar uma caçadora de alto nível.

Mas algo incomodava Tino. Ela colocou o baú de amostra sobre a mesa e falou hesitante.

— Mas, Lizzy, Greg é um caçador, não um mercador...

— Como se eu me importasse. Não foi o Krai Baby que disse que você precisa aprender mais do que apenas ser uma caçadora?

— Bem...

No leilão alguns dias atrás, Greg havia representado Tino e dado o lance vencedor em um golem. Apenas lembrar da expressão cansada de seu companheiro caçador já era suficiente para deixá-la desanimada. Tino não tinha sentimentos especiais por Greg, mas não era fria o bastante para ficar satisfeita vendo outra pessoa carregar um fardo que deveria ser dela.

O golem havia sido arrematado por um bilhão de gilds, o maior preço do dia.

A origem dos problemas de Greg provavelmente vinha do fato de ele ter dado o lance como indivíduo e, além disso, ser um caçador de nível médio. Desde que comprou o golem, Greg vinha lidando com todo tipo de inconvenientes. Pessoas pedindo empréstimos enormes, figuras duvidosas rondando ao seu redor, mercadores buscando conselhos e até mesmo alguns nobres prestando atenção nele.

Recentemente, Tino o encontrou por acaso. Ele parecia exausto com situações para as quais não estava acostumado e disse que evitava ao máximo lugares pouco movimentados.

Isso não se parecia com nenhum dos Mil desafios que Tino havia enfrentado até agora. Talvez não fosse tão ameaçador quanto ser arremessada dentro de um cofre do tesouro perigoso, mas poderia ser ainda mais desgastante.

Pode-se dizer que a longa experiência de Greg como caçador ficou evidente pelo fato de ele não ter deixado escapar que era apenas um substituto ou revelado o nome de seu empregador. Sua habilidade de avaliar a situação e saber quando fugir talvez até superasse a de Tino.

E era exatamente por isso que, mesmo que as circunstâncias atuais fossem difíceis para ele...

Tino teve sua linha de pensamento interrompida pelo olhar afiado de Liz. Sem perder sua postura imponente, Liz continuou.

— Isso não é algo com que você precisa se preocupar. Siddy já colocou gente investigando. Por que você acha que Krai Baby usou um caçador de fora da Primeiros Passos?

— ...Hã?

Tino não soube o que responder. Quando deixou Greg substituí-la, foi devido à sua própria falta de preparação e porque ele estava ali no momento. Pelo menos, não esperava que as coisas chegassem a esse ponto.

— Como estamos lidando com profissionais, precisamos ficar atentos até mesmo em leilões. Eles tentaram nos investigar, mas usamos um substituto e cobrimos nossos rastros. Tentaram interrogar o substituto, mas não conseguiram nada. Mas nós temos a Relíquia e, se eles quiserem pegá-la de volta, certamente vão usar gente especializada em recorrer à força. Quando isso acontecer, o nó ao redor do pescoço deles vai apertar um pouco mais.

— M-Mas fui eu que decidi que Greg ficaria no meu lugar.

— Ah, mas Krai Baby consegue enxergar todos os seus pontos fracos.

Tino não tinha resposta.

— Tenho certeza de que, no fundo, ele queria te corrigir, mas se ele fizesse isso diretamente, eu não estaria em posição de te repreender. Isso faz sentido?

Lágrimas se formaram nos olhos de Tino. Um sorriso fino surgiu nos lábios de Liz, que estalou os dedos.

Se isso fosse verdade, bem, não seria uma grande surpresa. Para Tino, tudo parecia apenas uma coincidência, mas em diversas ocasiões ela já tinha testemunhado o que seu mestre era capaz de fazer. Ela não achava que sua mentora estava mentindo.

Tino adorava seu Mestre. Respeitava-o como caçador e era grata por todas as vezes em que ele a havia resgatado. No entanto, suas habilidades inspiravam mais medo do que admiração nela. Isso também deixava evidente o motivo de até mesmo a aterrorizante Lizzy ter uma discípula, enquanto seu Mestre não tinha nenhuma.

— Bem, Siddy vai lidar com qualquer um realmente assustador, então Krai Baby acha que não há nada com que você precise se preocupar. Você deve evitar nossos inimigos o máximo possível; se eles ficarem desconfiados e recuarem, as coisas vão piorar. Não acho que isso vá estragar completamente os planos de Krai Baby, mas lidar com pessoas é uma dor diferente de lidar com fantasmas ou monstros. Você me entende, T?

— S-Sim, Lizzy...

Tino não pôde fazer nada além de concordar com sua mentora.

Liz não era apenas uma Ladina extraordinária, mas também uma caçadora de recompensas que já havia desmantelado inúmeras organizações criminosas e grupos fantasmas. Em nome do treinamento, Tino ocasionalmente era levada junto com sua mentora, mas, comparados a fantasmas e monstros, os humanos podiam ser complicados.

Mesmo que fossem mais fracos, os humanos eram inteligentes e maliciosos. Criminosos não ligavam para a lei, mas isso não significava que Tino e Liz poderiam agir da mesma forma. Apenas os criminosos mais perigosos tinham seus rostos estampados em cartazes de procurados.

Tino sentia pena de Greg, mas não achava que havia algo que pudesse fazer.

— Estou pensando em deixar Krai Baby te colocar para ralar um pouco. Depois desse incidente, percebi que há certos papéis que um filhote como você pode preencher e eu não.

— Treinamento com o Mestre...

O treinamento que sua mentora vinha impondo a Tino a deixava com um pé na cova constantemente. Ela nem conseguia imaginar o que significaria ser "colocada para ralar".

Ela estava frustrada por Krai ter enxergado sua fraqueza, mas o que Liz estava sugerindo ainda parecia um pouco demais para ela. Ser aceita nos Grieving Souls era seu objetivo para o futuro, mas não queria que isso acontecesse antes de estar pronta.

Ela quase encontrou seu fim na Toca do Lobo Branco, mas para o Mestre aquilo nem mesmo havia sido um dos Mil Desafios, o que significava...

...Eu não estou pronta. Eu não estou pronta para um teste desses, Mestre. Eu mal consigo sobreviver ao treinamento da Lizzy.

Só de pensar nisso, ela já sentia vontade de se encolher de medo, mas de repente ouviu um som de batidas.

Tino olhou na direção da porta. Ela tinha muitos conhecidos, mas poucos que visitariam sua casa. Isso porque sua temível e imprevisível mentora costumava estar à espreita por ali.

Certificando-se de que o humor de sua mentora estava em um de seus melhores dias, Tino abriu a porta.

Os olhos de Liz se arregalaram ao ver quem havia aparecido. Diante da porta estava um velho de cabelos brancos e rosto severo — Matthis Cardol, o dono da Magi’s Tale. Ele vestia um avental manchado e carregava uma pequena caixa ao seu lado.

Sua expressão suavizou um pouco ao ver Tino. Matthis pigarreou e começou a falar em um tom de desculpas.

— Ah, desculpe pela visita repentina, senhorita. Terminei a avaliação da Relíquia que você e o garotão pediram. Sei que vocês têm estado atolados até o pescoço ultimamente, então achei que talvez tivessem esquecido. Eu poderia simplesmente entregar isso diretamente para o garotão, mas foi você quem encontrou, não foi?

Os olhos de Tino se arregalaram. Matthis estava certo, o pedido de avaliação tinha saído completamente de sua mente. Na época, o interesse de sua mestra havia se voltado totalmente para a máscara, deixando todo o resto de lado.

Tecnicamente, a Relíquia já havia sido oferecida ao Mestre e não pertencia mais a Tino. Se Matthis estava entregando para ela, provavelmente era porque achava que ela poderia querer ser a responsável por entregá-la ao Mestre.

Liz olhou para Matthis e franziu a testa de forma bastante visível.

— Ei, Matty, que tal manter suas mãos longe da T se não tiver nossa permissão? Você não gostaria que sua esposa soubesse disso, não é? Se não quiser, então traga uma Relíquia bacana para o Krai Baby. Serei generosa e deixarei você pegar emprestado a T por um dia para cada Relíquia que nos trouxer, mas se deixar sequer um arranhão nela, eu acabo com você.

O rosto de Matthis ficou vermelho e ele começou a gritar.

— Desde quando você tá aí?! E eu não estou encostando nela, sua imbecil! Você, o garotão, ninguém mais respeita os mais velhos hoje em dia!

Trocas como essa aconteciam o tempo todo entre os dois. Como Matthis era um dos conhecidos mais antigos de Liz na capital, as discussões nunca passavam disso.

Matthis abriu a caixa. Dentro havia um formulário detalhando os resultados da avaliação e uma pulseira familiar.

— Por que está trazendo isso para a T e não para o Krai Baby? Creeeeepy. Você não gostaria que sua neta soubesse disso, não é? Qual era o nome dela? Cecy? Se não quiser que ela saiba, então traga uma Relíquia que deixe o Krai Baby feliz.

— O-Onde você ouviu— Ah, que se dane! Foi a senhorita quem encontrou a Relíquia, não foi? E eu quase nunca recebo Relíquias que interessem ao garotão! Se vocês são caçadores de verdade, então que tal encontrarem suas próprias Relíquias?!

— Você não tinha montanhas de Relíquias boas antes? Estava comentando com o Gark outro dia que acho que você está perdendo o jeito.

— Isso é porque o garotão comprou todo o meu estoque! Que tal dizer para ele me vender algo que preste?!

Após lançar um olhar de soslaio para os dois brigando, Tino voltou sua atenção para o formulário que explicava a Relíquia.

— Mirage Form? Um dispositivo de projeção de luz? Alcance efetivo: um metro. Se usado corretamente, permite fazer uma figura humana dançar na palma da mão — murmurou. — É uma Relíquia que cria miragens?

...Parecia que essa não seria uma Relíquia fácil de avaliar.

Caçadores preferiam Relíquias simples e poderosas, como um cantil que produz um suprimento infinito de água ou espadas que aceleram quando balançadas. Quanto mais fácil de usar e mais simples fosse seu efeito, maior seria o valor de uma Relíquia.

— É uma peça rara. Pelo menos, não é algo que normalmente se encontra nas Ruínas de Alleyne Pillars.

Essa pulseira era uma peça complicada. Criar miragens poderia ter suas utilidades, mas o alcance era curto e parecia difícil de manusear. Se tentassem vender a Relíquia, era difícil imaginar que valeria muito.

Se alguém quisesse criar miragens, seria muito mais simples apenas usar magia; qualquer Mago com um pouco de talento conseguiria fazer isso. Para algo que sua Mestra havia instruído a recuperar, essa Relíquia parecia bem sem graça.

De repente, Tino percebeu que a pulseira não estava mais dentro da caixa. Liz a havia pegado e a examinava atentamente. Após alguns momentos em silêncio, virou lentamente a cabeça para Tino.

— Vou ser eu quem vai entregar isso para o Krai Baby. Alguma objeção, T?

— Hã? N-Não, nenhuma, Lizzy.

Como sempre, Tino concordou quase que por reflexo. Liz segurou a pulseira contra o peito e girou no lugar, parecendo mais feliz do que em qualquer outro momento recente.

Enquanto Matthis observava, perplexo, a diferença de animação entre Tino e sua mestra, Liz gritou com uma voz transbordando de alegria.

— Uhuuul! Krai Baby vai adorar isso! Bom trabalho, T, vou comprar uma adaga nova para você depois.

— Hã? Tudo isso?! Ah, uhh, Lizzy, e-espera um minu—

Liz quase nunca dava presentes para Tino. Essa pulseira devia ser realmente algo especial.

Tino estava prestes a tentar recusar a oferta de Liz quando uma voz atrás dela a interrompeu.

— Espere um momento, Lizzy! Isso deve ser resolvido de forma justa. Não é mesmo, T?

Era uma voz muito familiar para Tino. Em algum momento, a outra irmã, Sitri Smart, havia aparecido atrás dela, com um sorriso no rosto.

Tino sentiu uma mão em seu ombro e começou a tremer. O sorriso desapareceu do rosto de sua mestra.

— Hã? T é minha aprendiz, então é natural que o que ela encontra pertença a mim. Por que está se metendo, Siddy?

A voz de Liz era capaz de intimidar praticamente qualquer pessoa, mas não sua irmã.

— Eu fui a responsável por causar tantos problemas para o Krai, e tudo começou porque você disse que queria treinar em um golem. Portanto, deveria me entregar a Relíquia. Você concorda comigo, não é, T?

Sitri fez sua afirmação com fluidez, como se a questão já estivesse decidida, e então perguntou a Tino se concordava. Sua voz não tinha a aspereza da de Liz, mas ainda assim era uma voz que não admitia objeções.

Em um tom baixo, ela sussurrou algo extra no ouvido de Tino.

— Se me entregar isso, eu te compro uma adaga nova e um veeery lindo vestido.

Dentro da aconchegante casinha onde Tino morava, palavras terríveis de difamação voavam para todos os lados.

— Quem te deu permissão para ir seduzir a T?! O Bebê Krai me deixou responsável por ela! Ele disse que eu podia fazer o que quisesse com ela!

A dona da casa, Tino, estava encolhida em um canto, observando a discussão se desenrolar.

Em teoria, os caçadores ganham cada vez mais força física à medida que exploram cofres de tesouro. Ao absorver material de mana, eles pelo menos aprimoram suas capacidades básicas e também ganham experiência. Isso torna extremamente difícil vencer um caçador de alto nível.

Tino tinha certa confiança em suas habilidades como caçadora de nível intermediário. No entanto, ainda estava muito abaixo de Liz e Sitri, que levavam uma rotina árdua muito antes de Tino se tornar uma caçadora.

Com uma veia saltando na testa, uma das irmãs gritava com uma voz estridente que inspirava tanto pavor quanto qualquer dragão.

— T é sua aprendiz porque você fez birra! Era pra ela ter sido minha desde o começo. Se ela fosse minha desde o início, a essa altura já poderia ser uma supercaçadora sem precedentes, capaz de voar e disparar lasers pelos olhos!

A outra irmã respondeu com um tom mais baixo que o usual. Comparada a Liz, Sitri mantinha a compostura, mas seu corpo emanava a mesma aura poderosa da irmã.

Se duas pessoas tivessem o mesmo talento, estivessem no mesmo grupo e tivessem experiências semelhantes, seus níveis de material de mana seriam equivalentes. As irmãs Smart tinham ocupações completamente diferentes, mas, da perspectiva de Tino, seu poder era praticamente o mesmo.

Tino já havia explorado cofres de tesouro sozinha, o que, pelos padrões normais, tinha aprimorado muito suas habilidades. No entanto, comparada às irmãs Smart, era apenas um grão de poeira. Em situações como essa, tudo o que podia fazer era tremer no canto e esperar a tempestade passar.

— Afinal, é melhor ter uma mentora rica que pode te dar poder facilmente do que uma mentora que te faz fazer exercícios estranhos — argumentou Sitri.

— Hã?! Não há sentido em um poder que é simplesmente entregue de mão beijada! E você não só daria poder, como também pegaria! — retrucou Liz.

— Eu tomaria cuidado com o que pegaria! Com T, eu não precisaria tirar o livre arbítrio dela, e ela sempre foi uma pessoa obediente! O que mais eu poderia querer?!

— Chega, suas pestes! Vocês não deviam estar brigando, estão assustando a garotinha!

Matthis, que observava tudo com uma careta, decidiu intervir. Mas nem Liz nem Sitri pareciam se acalmar.

— T e eu encontramos aquela Relíquia, então fica fora disso! — disse Liz.

— Você não encontrou nada, T achou depois de procurar muito! Ela disse que vai me dar a Relíquia, então eu tenho o direito de decidir o que fazer com ela! — Sitri rebateu.

Eu nunca disse isso, Sitri... pensou Tino.

Ela estava prestes a protestar quando ambas as irmãs viraram os olhos para ela, impedindo-a de dizer qualquer coisa.

A posse da Relíquia Mirage Form parecia ter se tornado uma questão completamente alheia à opinião de Tino sobre o assunto. Ela gostava da ideia de uma nova adaga e um vestido, mas se essa Relíquia faria Krai tão feliz, então queria ser ela a entregá-la. No entanto, parecia inútil tentar recuperá-la.

Ainda assim, pensar que uma briga dessas estouraria por causa de quem entregaria a Relíquia...

— Sinceramente, por que você tem que sempre se intrometer como um urubu?! Vai se esconder no seu laboratório!

— É porque você sempre, seeempre causa problemas! Não importa o quanto eu tente, nunca consigo apagar todos os incêndios que você começa!

— Hã?! Isso também serve para o Luke, não serve?! Além disso, ninguém te pediu para apagar incêndio nenhum!

— No caso do Luke não importa, porque as pessoas com quem ele causa problemas não contam histórias! Você é a única que me dá trabalho!

— Ah, uhm... Eu não tenho segundas intenções, talvez vocês possam ceder e me deixar entregar— Ah!

Liz não demonstrou nenhum sinal de ter ouvido a voz fraca de Tino antes de pegar uma caixa de tesouro do chão e lançá-la contra Sitri. A caixa foi atirada sem um pingo de hesitação, mas Sitri, demonstrando reflexos excelentes para uma Alquimista, pegou uma bandeja da mesa e a usou como escudo.

A caixa ricocheteou e destruiu um armário antes de se cravar na parede, provocando um estrondo de vidro se estilhaçando.

Tino reuniu o resto de sua coragem e falou com uma voz fraca.

— Parem com isso, vocês duas! Quem vai ter que lidar com a bronca dos vizinhos sou eu!

Usando ambas as mãos, ela rapidamente pegou uma xícara de chá e um bule arremessados pelo impacto. Felizmente, Liz aparentemente não estava indo com tudo, pois, com um pouco de concentração, Tino conseguiu acompanhar. No meio dos móveis voando, ela determinava instantaneamente se algo era frágil e, se fosse, pegava e colocava no canto. O resto, ela apenas derrubava.

Tino estava desesperada. Agradecia que a briga não tivesse começado durante uma refeição. Conseguia lidar com panelas e xícaras, mas se facas e garfos começassem a voar, poderia acabar se machucando feio. Pelo menos, sentia que precisava proteger Matthis.

Enquanto os objetos continuavam a ser lançados, as duas irmãs não paravam de se insultar.

Matthis tremia enquanto assistia à confusão, que foi de zero a cem em um instante.

— Tanto faz quem entrega isso... — murmurou.

— Vocês duas, acalmem-se! Se vão brigar por isso, então... então eu entrego a Relíquia! — gritou Tino.

Ela reuniu coragem para gritar assim, mas sua voz nem sequer chegou às irmãs Smart.

Ainda estava tudo bem enquanto apenas jogassem qualquer coisa que estivesse por perto, mas se Tino não interviesse logo, poderiam começar a arremessar facas e poções. Isso deixaria sua casa praticamente destruída e, se isso acontecesse, teria que viver entre os escombros até conseguir juntar dinheiro para consertá-la.

Não seria viável para ela intervir à força, e nenhuma das irmãs recuaria se apenas Tino tentasse se colocar entre elas. Para interromper isso, seria necessário um membro dos Grieving Souls ou alguém como o vice-mestre do clã; alguém ligado a Krai e com um mínimo de bom senso. Infelizmente, esse tipo de pessoa raramente aparecia na casa de Tino.

Confusa e desesperada tentando derrubar qualquer projétil voador, Tino esforçava-se ao máximo para minimizar os danos. Então, de repente, ouviu o que parecia ser uma batida na porta.

***

— Mestre, eu senti taaanta saudade de você!

O que está acontecendo?!

Ainda segurando o bolo ao meu lado, meus olhos se arregalaram.

Olhei para baixo, para Tino, que havia pulado em mim, surpreendido por sua exuberância nada característica. Ela retribuiu meu olhar com olhos marejados, e senti uma estranha vontade de protegê-la.

Eu estava completamente confuso. Claro, eu havia decidido interpretar o papel de mestre durão e atencioso, mas não esperava uma recepção tão entusiasmada. Ainda perplexo, afaguei a cabeça de Tino, do mesmo jeito que fazia com Liz, e entrei.

A casa de Tino estava um verdadeiro caos. Da última vez que estive aqui, o lugar estava limpo e organizado, mas agora mal parecia a mesma casa. Espalhados pelo chão, havia baús de tesouro abertos, vidro quebrado e até um armário tombado. Parecia uma ruína abandonada, mas bonita.

Cheguei em um momento ruim?

No centro da sala de estar, vi uma cena familiar: as irmãs Smart se encarando. Quando notaram minha chegada, Liz, por alguma razão, começou a abanar a faca como se fosse um leque, enquanto Sitri inflou as bochechas e escondeu uma poção vermelha ardente atrás das costas.

— Ah... — disse Liz. — Bom dia, Krai baby.

— Puxa, Lizzy, por causa da sua confusão, você fez o Krai vir até aqui — disse Sitri. — Bom dia para você, Krai.

— D-Demorou demais, moleque! Anda logo e faz alguma coisa!

Não havia nada de estranho em Liz e Sitri estarem na casa de Tino, mas, por alguma razão, até Matthis estava aqui. Com o rosto vermelho e claramente agitado, ele me encarava intensamente. Eu só queria trazer um bolo, e agora estava no meio dessa bagunça...

Coloquei a mão sobre uma convenientemente posicionada Tino e me acalmei, passando os dedos pelo cabelo dela enquanto inclinava a cabeça.

Não faço ideia das circunstâncias, mas...

— Para começar — falei. — Sentem-se. Formalmente.

— Não, Krai, isso é só um mal-entendido... — protestou Sitri.

— Uhh, resumindo, Siddy e T estavam tentando roubar meu brilho. Então eu não fiz nada de errado, viu? — argumentou Liz.

Com as pernas dobradas sob elas, Liz e Sitri se sentaram no tapete e tentaram se justificar.

Recostei-me na cadeira e suspirei profundamente. Tino, que agora havia se acalmado, sentou-se ao meu lado e, por alguma razão, olhava para mim com admiração.

— Não, não, não, não é assim que se faz.

Eu não sabia exatamente o que tinha acontecido, mas sabia que aquilo não era um pedido de desculpas. Como mestre da arte de se desculpar, me senti seguro em dar a elas uma nota zero. Liz e Sitri ficaram em silêncio, os olhos marejados, enquanto eu apontava seus erros.

Quando estavam lado a lado, ficava claro que essas duas eram irmãs. Desde pequenas, Sitri e Liz sempre brigaram. Fosse verbalmente ou com lutas de verdade, eu já estava acostumado, mas mesmo depois de se tornarem caçadoras poderosas, ainda eram rápidas para começar uma discussão. Eu tinha certeza de que outras pessoas achavam isso insuportável.

— Por que você... — começou Sitri. — Deixa pra lá. Não é como se nossa briga fosse séria ou algo assim.

— Ela está certa — acrescentou Liz. — Isso é só um tipo de exercício de aquecimento! T está acostumada com isso, então não tem motivo para você se meter.

Parecia que elas sentiam certa culpa pelo que tinham feito. Diferente de mim, elas raramente tinham necessidade de se desculpar, então as palavras não saíam com facilidade.

Mas eu só queria entregar um bolo.

Matthis parecia exasperado com a mudança repentina de atitude de Sitri e Liz.

— O moleque ainda é o ponto fraco delas... — murmurou ele.

— Isso acontece quando se conhece alguém há muito tempo — eu disse.

— Não acho que seja só isso...

Tenho certeza de que Liz começou a briga desta vez também. Ela é rápida para partir para a violência por qualquer coisa...

Mas ela não é incontrolável, dá pra falar com ela... Ela só esquece imediatamente o que foi dito.

— Eu sabia que podia contar com você, Mestre — disse Tino. — Muito, muito obrigada. Só você pode parar as brigas delas.

Lágrimas se acumularam nos olhos de Tino. Ela me olhava com o que eu não chamaria de adoração, mas de veneração.

Desculpa. Sério, desculpa.

— Lembre-se bem disso, T — disse Liz. Ela cerrou o punho e lançou um olhar ameaçador para Tino.

— Eu só estava considerando o que seria melhor para nós duas... — disse Sitri. Ela olhou para Tino com um olhar suplicante, quase pedindo compaixão.

Não parecia que haveria arrependimento algum.

Eu não estava dizendo para pararem de brigar completamente; suas brigas eram prova de que eram próximas. No entanto, eu estava me divertindo repreendendo-as, mesmo sem saber pelo que estavam brigando.

Sitri pareceu interpretar meu silêncio de alguma forma. Com completa naturalidade, ela habilmente se aproximou de mim, ainda mantendo as pernas dobradas sob o corpo. Ela me abraçou firmemente pelas pernas e falou com uma voz aguda. Mesmo comparada a Liz e Tino, ela tinha um belo corpo. Especificamente, um busto volumoso.

Senti algo macio pressionando contra mim. Era extremamente desconfortável.

— Me desculpe, Krai. Não queríamos te causar problemas. Com um pouco mais de tempo, teríamos resolvido tudo pacificamente!

Eu era fraco contra sensações macias, mas duvido que exista um homem que não seja.

Ainda assim, não havia chance de que as coisas se resolvessem pacificamente com mais tempo. Será que ela estava planejando usar alguma magia?

— O mesmo vale pra mim. Eu não queria te causar problemas, Krai baby. Se T e Siddy tivessem sido menos egoístas...

Competindo com Sitri, Liz se levantou, jogou-se em mim e envolveu meus pés com os braços. Eu me sentia como um rei.

Eu não sabia nada sobre o que estavam brigando, mas assenti de forma compreensiva e estalei os dedos.

— Sim, aham. Por agora, vocês duas vão limpar.

Sitri e Liz se levantaram. Eu poderia cuidar das coisas, mesmo sem entender direito a situação.

— Ah, eu adoro limpar! Vou dar o meu melhor!

— Siddy, você providencia mais vidro. Eu cuido da limpeza — disse Liz. — E, desta vez, nos poupe do trabalho e compre um vidro mais resistente.

— Nossa, Lizzy, esse era o mais resistente— Ah, esquece que eu disse qualquer coisa.

Sitri saiu correndo pela porta enquanto Liz recolhia os copos espalhados e arrumava o armário. Não era a primeira vez que isso acontecia, então elas estavam acostumadas a limpar a bagunça.

Dê um tempinho a elas e esta sala voltará a ser como antes.

A única coisa nova que aprendi naquele dia foi que Liz e Sitri não eram totalmente incapazes de sentir culpa.

... Eu realmente gosto quando Sitri pressiona o peito contra mim.

Enquanto eu encarava o nada, Tino, que finalmente havia se recuperado um pouco, me fez uma pergunta timidamente.

— Mestre, o que te trouxe aqui hoje?

— Ah, trouxe um bolo. É um novo produto. Considere isso um jeito de agradecer.

Como Liz e Sitri sempre te causam problemas, era o que eu planejava dizer, mas então percebi as lágrimas de emoção escorrendo pelo rosto de Tino.

— M-Muito obrigada, Mestre — disse ela, fungando. — Eu vou te seguir até o fim da minha vida.

— E-Ei. Quero dizer, é só um bolo. Ei, não chore.

Tino está exagerando. Tudo que eu fiz foi trazer um bolo... Talvez eu devesse ser mais gentil com ela.

Fungando e esfregando os olhos cheios de lágrimas, Tino abriu a caixa. Seus olhos se arregalaram por um instante ao ver as duas fatias de bolo dentro, mas logo ela acenou com satisfação.

— Você nunca falha, Mestre. A outra fatia é para Matthis, não é?

Hã? É minha? Essa fatia extra é para mim? Eu nem sabia que Matthis estaria aqui.

— Tsc, sentimentalismo desnecessário. Se teve tempo para se preocupar com meus sentimentos, deveria ter chegado mais cedo — disse Matthis.

Não tem nada de sentimental nisso. Eu não planejava te dar nenhum bolo e, se você não quiser, melhor ainda.

A declaração inesperada de Matthis me deixou paralisado, mas minha talentosa subordinada Tino imediatamente me defendeu.

— O Mestre é muito rígido com formalidades. Não se preocupe, ele tem o melhor gosto para bolos.

— Tsc. Bom, se você insiste. Seria rude recusar, e eu posso simplesmente dar para minha neta ou algo assim.

— Sim, aham.

Se você insiste, não há como um covarde como eu recusar. O que Tino acha que eu vim fazer aqui? Eu só queria aproveitar um bolo com ela.

Foi então que percebi, sobre uma mesa, uma caixa contendo um bracelete familiar. Tino pareceu perceber para onde eu estava olhando. Ela hesitou por um instante antes de um sorriso surgir em seu rosto.

— Perfeito, Mestre. Matthis terminou a avaliação da Relíquia e trouxe para cá! Olha, é a Relíquia que eu encontrei antes! Fui eu quem achou!

Em algum momento, Sitri havia retornado. Ela estava com um sorriso inabalável e encarava Tino diretamente.

— Lizzy, falhamos em discipliná-la? — perguntou.

***

Meu mundo brilhava.

Eu não me perturbava com o estresse de minhas inúmeras responsabilidades como mestre do clã. Não tinha preocupações com o futuro.

Eu estava cantarolando enquanto caminhava pelo corredor em direção ao meu escritório quando, por acaso, encontrei Eva. Eu tentava manter minha expressão neutra como sempre, mas ela deve ter percebido que algo estava diferente.

— Aconteceu alguma coisa? — ela perguntou, arregalando os olhos. — Você parece estar de ótimo humor.

Agora, eu queria... cantar e dançar. Mas sou durão, então não vou.

Não era surpresa que eu não conseguisse esconder nada de Eva; nos conhecíamos havia muito tempo. Eva me olhou desconfiada, e eu mostrei a faixa preta no meu braço direito — a Mirage Form.

No fim, minha parte do bolo acabou indo para Matthis, mas agora eu podia rir disso. Fiquei tão feliz por ter ido à casa da Tino.

A expressão de Eva mudou na hora. Ela se aproximou de mim com um olhar severo.

— Hã?! Você comprou outra Relíquia nova?

— O quê? Ah, não, Tino encontrou e me deu. Minha dívida não aumentou.

Eva suspirou.

— Bem, eu tenho minhas próprias preocupações sobre isso, mas...

Eu também tinha, mas não era meu lugar me intrometer na relação de mestre e aprendiz de Liz e Tino. Tentei dar alguns avisos sutis a Liz, mas ela nunca ouvia. Tudo que eu podia fazer era manter um olho nelas.

Mas nada disso importava para mim no momento. Eu estava encantado com minha nova Relíquia. Tino a encontrou nas Ruínas de Alleyne Pillars e ela era bem única; sua função era produzir miragens. Havia muitas Relíquias do tipo bracelete, até algumas na minha coleção, mas nunca vi uma que criasse miragens. A demanda era o principal fator de valor de mercado de uma Relíquia, então eu não podia ter certeza de quanto essa valia.

No entanto, nunca tinha ouvido falar de uma Relíquia assim antes, então devia ser bem rara. Gostei disso.

Matthis até teve a gentileza de recarregá-la completamente para mim. Eva ainda parecia um pouco insatisfeita, então decidi mostrar as maravilhas dessa Relíquia. Eu já tinha outras Relíquias do tipo bracelete, então sabia como ativá-la. Concentrei-me e encarei atentamente, até que o bracelete começou a esquentar levemente e luzes dançaram sobre minha palma aberta.

— Olha, Eva. Bolo!

— Ah, aham. Isso é um bolo...

A miragem era do bolo que eu havia levado para Tino. Uma iguaria coberta com um creme dourado especial e frutas que só podiam ser encontradas em florestas densas em mana. Mirage Form era uma Relíquia capaz de projetar imagens tridimensionais.

Havia duas grandes categorias de artes ilusórias: as que afetavam a mente de um alvo e faziam com que ele visse imagens e as que projetavam uma imagem real. Essa Relíquia era do segundo tipo. Era um item de nicho e parecia exigir um bom tempo de treinamento para ser usada com eficácia, mas eu conseguia pensar em algumas utilidades para ela.

Eva olhou para o bolo, que parecia estranhamente irreal, e tentou tocá-lo. Quando seus dedos afundaram na imagem, ela fez uma careta engraçada. Havia algo que o distinguia do bolo que eu havia dado para Tino. Era uma miragem, então não havia como esperar sabor ou aroma, mas até mesmo a aparência não estava certa.

O bolo real era praticamente uma obra de arte; tinha sido pensado após inúmeras tentativas e erros e montado por uma mão habilidosa. A miragem que eu conjurei era apenas algo com uma forma e cor semelhantes. Comparando lado a lado, ficava claro o quanto minha miragem era inferior.

...É porque tive dificuldade em visualizar a forma do bolo. Eu estava tão focado no sabor que não prestei muita atenção na aparência. Quero acreditar que posso melhorar com a prática.

— Ei, não faça essa cara — eu disse. — Aqui, vou fazer você, Eva!

Até onde Matthis conseguiu discernir, o alcance efetivo da Relíquia era de um metro ou, para ser mais preciso, um metro e vinte centímetros. Essa distância era tanto o limite para projetar uma miragem quanto o tamanho máximo de uma. Em outras palavras, era possível usar essa Relíquia para projetar um ser humano em tamanho real.

Com um alcance de um metro e vinte centímetros, dava para criar uma miragem de até dois metros e quarenta centímetros posicionando a Relíquia no centro. Sem contar que você podia fazê-las parecer do jeito que quisesse!

Era possível recriar apenas metade de Ansem, mas esse alcance seria mais do que suficiente para alguém como Gark. O fato de que só era possível posicionar a miragem ao lado do usuário era um problema, mas um uso inteligente ainda permitiria intimidar ou conter inimigos em um cofre de tesouros! O único problema era que um Magus ainda poderia criar miragens com mais facilidade e em um alcance maior.

A miragem da Eva que apareceu era idêntica à Eva real. Os óculos finos e o olhar penetrante eram uma cópia perfeita. Observando de perto, percebi que alguns detalhes estavam errados, mas eram próximos o bastante para serem chamadas de gêmeas.

Exceto que era só a cabeça dela...

Sem hesitar, Eva deu um tapa em sua própria cabeça flutuante e então me lançou um olhar idêntico ao da miragem.

— Por favor, pare de brincar — ela disse.

— Eu não sou bom com corpos — eu disse. — Sem uma visão adequada, não consigo ter certeza, mas talvez se eu apenas cobrisse com um manto...

Eva viu que sua miragem agora parecia um tipo de decoração de fantasma e reiterou seu sentimento anterior.

— POR FAVOR. PARE!

***

Eu estava nos meus aposentos secretos.

Adicionei "Forma de Miragem" ao registro da minha coleção. Ciente de que poderia estar me iludindo, me perguntei se essa Relíquia poderia me permitir me disfarçar e servir como um substituto para a Face Reversível, que eu havia falhado em adquirir. As possibilidades eram infinitas.

Eu queria começar a treinar com a Forma de Miragem imediatamente, mas sem Lucia, não seria fácil recarregá-la. Só para testar, projetei o rosto de Ark sobre o meu e caí na gargalhada ao ver o resultado horrível no espelho. A visão do meu cabelo preto saindo pelas bordas do cabelo loiro de Ark era bizarra demais.

Diferente da Face Reversível, a Forma de Miragem apenas produzia imagens, então parecia que eu teria que tomar cuidado ao usá-la para disfarces. Talvez eu precisasse de um chapéu que pudesse manter meu cabelo no lugar.

Agora que penso nisso, Sitri disse que mantém o cabelo curto para se disfarçar com mais facilidade.

Eu precisava confirmar por quanto tempo poderia manter uma miragem, então comecei a folhear meu registro enquanto usava a aparência de Ark. Eu procurava por uma Relíquia que combinasse bem com Tino. Depois de receber um item tão bom dela, senti a necessidade de dar algo em troca. Afinal, as Relíquias que Liz e Sitri usavam vinham todas da minha coleção.

Eu era um colecionador de Relíquias, mas não era do tipo que sentia prazer apenas em admirá-las como decoração. O que me alegrava era vê-las sendo usadas pelos meus amigos.

Como mentora de Tino, Liz teria a palavra final sobre o uso de uma Relíquia, mas Tino eventualmente entraria para nosso grupo, então não custava nada escolher algo para ela. Eu estava empolgado por finalmente ter um trabalho divertido e examinei cada uma das minhas Relíquias.

Tino é uma Ladina, então talvez ela devesse ter o mesmo tipo de Relíquia que Liz? Ou talvez uma diferente, já que estarão no mesmo grupo?

Minha coleção era vasta. Eu tinha Relíquias poderosas e também aquelas que podiam servir como substitutas da magia. Escolher sua Relíquia principal era um evento que podia mudar o rumo da vida de um caçador. Tino era uma garota séria e, se eu fosse compartilhar minha coleção, queria dar algo para alguém que realmente faria bom uso. Não podia ser descuidado com isso.

Eu estava deitado na cama, folheando o denso registro, quando ouvi uma leve batida na porta. Devia ser Tino. Mandei que entrasse e a porta se abriu apenas um pouco. Um pequeno olho negro espiou, receoso, pela fresta.

— Com licença, Mestre... — ela disse em voz baixa.

Era incomum vê-la tão nervosa. Não que eu planejasse dar uma Relíquia a ela naquele momento, só queria conversar. Eu levaria nossa conversa em conta na minha escolha e, dependendo das circunstâncias, poderia até comprar uma nova Relíquia para ela.

Se for para Tino, então, com bastante súplica, Matthis talvez até nos desse acesso à coleção dele.

Tino e eu ficamos em silêncio, nos encarando, quando Liz entrou voando no quarto. Tino soltou um grito curto ao ser empurrada para frente. Ela devia ter trocado de roupa desde minha visita; agora usava uma saia preta curta que esvoaçou enquanto ela caía.

— Krai Baby, chegamos! — Liz proclamou.

— Vocês terminaram a limpeza? — perguntei.

— Contratamos um parceiro confiável, então está tudo resolvido. No fim, os danos não foram tão graves... — Sitri disse com um sorriso enquanto entrava.

Eu só tinha chamado Tino para me ver, mas, por alguma razão, as irmãs Smart vieram com ela. A opinião de uma mentora e de companheiras de grupo era importante na escolha de uma Relíquia, então eu não tinha nenhuma objeção real.

Liz olhou para mim e começou a rir baixinho.

— O que aconteceu com esse seu rosto? Isso aí era pra ser o Ark? Hilário!

— ...Estou impressionado que você conseguiu perceber que sou eu.

— Ha ha ha! Dá pra saber pelo seu cheiro e pela sua presença. Você vai precisar de um disfarce bem melhor do que esse pra me enganar!

Pensando bem, a Liz também viu através do meu disfarce na hora quando usei o Rosto Reversível pela primeira vez.

O Rosto Reversível fazia mais do que apenas projetar uma imagem, mas ainda assim não funcionou contra ela. Os sentidos de uma caçadora de alto nível eram algo realmente assustador.

Exceto pelo fato de que isso não explicava por que a Eva também conseguiu ver através do disfarce.

Sitri também levou um momento para analisar meu disfarce antes de dar um leve aceno de cabeça.

— Krai e Ark têm físicos diferentes — disse ela. — Pode até funcionar com alguém que não te conhece, mas acho difícil enganar qualquer um do nosso clã.

Eu estava certo—preciso de mais prática. Talvez eu peça pra Sitri e Liz treinarem comigo mais tarde. Considerando as características da Relíquia, pode haver mais funções, como a habilidade de salvar miragens pré-definidas ou algo assim. Bom, por enquanto, melhor focar na Tino.

Flanqueada por Liz e Sitri, Tino mexia na barra da saia e olhava ocasionalmente na minha direção. Seu olhar alternava entre mim e a vitrine de vidro organizada atrás de mim. Eu já tinha dito a ela sobre o que queria conversar, então provavelmente ela também tinha algumas sugestões próprias.

— U-uh, Mestre—

— Krai, querido, pode arranjar uma Relíquia super poderosa pra gente? A T não absorveu muito material de mana ainda, e ela ainda é uma novata em treinamento. Pega alguma coisa que cubra as fraquezas dela! Não adianta nada dar pra ela algo como as Raízes do Apex, sabe?

Liz falou sem um pingo de maldade e deu uns tapinhas nas próprias pernas. A Relíquia dela era bem simples, sem nenhum recurso que pudesse virar o jogo numa batalha. Raízes do Apex só permitiam que você desse impulsos no ar, sem nada para se apoiar. Era uma Relíquia que exigia um esforço contínuo para ser dominada. Até eu tive dificuldades em usar as Raízes do Apex, então conseguia entender por que poderia ser cedo demais para Tino usar algo desse nível.

Sitri, que usava uma pistola d’água de baixa potência, concordou com um aceno e deu sua própria opinião.

— Liz está certa. A gente só consegue cobrir a Tino até certo ponto. Se tiver alguma Relíquia que simplesmente melhore a resistência ou as capacidades básicas dela, talvez seja o melhor. Preferencialmente, uma que faça uma melhoria considerável...

— Lizzy, isso é—

Lágrimas se formaram nos olhos de Tino. Para um caçador, melhorar as capacidades básicas com uma Relíquia era considerado prova de que ainda era um novato. Afinal, capacidades básicas eram algo que poderiam ser aprimoradas apenas absorvendo mais material de mana.

Eu não ligava muito pra isso, mas alguns caçadores desprezavam ou eram rudes com quem usava esse tipo de Relíquia. Como resultado, Relíquias que aumentavam os atributos básicos não eram muito populares, apesar de serem bem úteis.

Assenti em concordância. Eu me sentia mal por Tino, mas não achava que Liz e Sitri estavam completamente brincando; cofres do nível 8 eram brutais. Liz e Sitri não estavam dizendo isso apenas para provocar.

O que fazer?

Pessoalmente, eu queria basear minha decisão não apenas nas opiniões de Liz e Sitri, mas também na da Tino. Caçadores poderiam ter mais afinidade com algumas Relíquias do que outras. Fechei os olhos e refleti sobre o assunto, mas então me lembrei de que não precisava decidir imediatamente, então apenas assenti.

As Relíquias não iriam a lugar nenhum. Eu poderia chamar a Tino depois e pensarmos juntos com calma.

Ainda assim, capacidades básicas, hein... Isso poderia ser complicado. A Tino está se esforçando, mas o ritmo que os Grieving Souls exploram cofres ainda está muito além dela. É possível que ela nunca consiga acompanhar.

— Eu, por mim, gostaria de caçar com a T o mais rápido possível. Mas, francamente, acho que ela ainda tem algumas deficiências. Embora existam formas de compensar essas falhas... — Sitri disse. — Krai, será que você poderia me deixar cuidar da Tino por um tempo? Tenho certeza de que não vai se arrepender.

As bochechas de Sitri estavam coradas e ela se remexia, evitando me encarar diretamente. Tino estava ao lado dela, tremendo.

Foi então que me lembrei de que tinha conseguido algo especial.

— Já sei! — exclamei. — Tenho algo que vai deixar a Tino super forte!

— Hã?!

Eu ainda não sabia se aquilo serviria para a Tino, mas não custava nada tentar. Tinha quase certeza de que ainda havia um pouco de mana nele. Os ombros de Sitri caíram e Liz me olhou surpresa enquanto eu passava por elas e abria uma das vitrines de vidro.

Quando Tino viu o que eu tinha pegado, ficou pálida e deu um passo para trás.

— Hã? Mestre?

— Consegui isso há pouco tempo.

Liz assobiou e Sitri bateu palmas, sorrindo como se tivesse acabado de ver algo incrível. O que eu segurava nas mãos era a Evolve Greed, que ostentava uma expressão patética desde que a peguei.

Esse troço não tem motivação nenhuma? Mesmo segurando, ele não dá sinal de vida. Que Relíquia inútil.

Tino parecia completamente confusa.

— Hã? Hããã? E-eu vou— Isso é uma piada, né?

— Parece meio assustador, mas eu acho que é bem forte. Transformou uma garota nobre em alguém com a força de uma caçadora de nível médio. Ha ha, mas quando eu usei, disse que não podia me deixar mais forte...

Fiz um sorriso vazio, mas Tino não retribuiu nem um pouco.

Ark disse que essa máscara colocou ele e outros em perigo, mas uma Relíquia não passava de uma ferramenta. Problemas podiam surgir dependendo do uso, mas com Sitri e Liz ao meu lado, não me preocupava com a pequena possibilidade de algo dar errado. Já tínhamos aprendido que a máscara podia ser removida de fora.

— Experimenta — falei. — Só um pouquinho? Dizem que ela ativa só de colocar. E também quero ver os efeitos com meus próprios olhos.

— Isso... Mestre, você me odeia?

Tino recuou ainda mais, mas Sitri, que havia se esgueirado atrás dela, segurou seus ombros. Liz olhava para a máscara com um brilho nos olhos.

Com um timing perfeito, Evolve Greed despertou e falou com uma voz rouca.

— Oh, um novo alimento? Que alma inabalável eu sinto! Venere-me. Liberte sua fúria, sua força oculta. Eu sou aquele que faz a humanidade avançar. Sua existência, seu tudo, se tornará a lâmina que dilacera seus inimigos.

— Eee! Socorro, Mestre! Eu tenho certeza! Essa coisa é definitivamente amaldiçoada!

— Não se preocupe, não dói. Não doeu... — comecei. — Eu experimentei usar mais cedo. Fique calma, tá? É só uma Relíquia. Respire fundo.

— N-NÃÃÃÃO!

Convenientemente, tentáculos contorcidos se estenderam da máscara, ajudando a manter Tino imóvel.

O que ecoava pelo meu quarto era um grito ensurdecedor.


Tradução: Carpeado 
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