Hai to Gensou no Grimgar | Grimgar of Fantasy and Ash Volume 12 Capítulo 16
[Aquele que Aterrissou]




A costa leste da ilha era composta principalmente por praias rochosas, enquanto a costa oeste tinha mais praias de areia. Assim, embora viajar para o norte ao longo da costa leste fosse um caminho mais curto, a rota mais longa pela costa oeste era mais fácil de percorrer, apesar do desvio.

Havia penhascos íngremes em alguns trechos da costa, forçando-os a entrar na floresta nesses pontos. No entanto, Tsiha e Mwadan estavam acompanhando a party.

A tribo Kamushika, à qual Tsiha pertencia, era numerosa, e Mwadan era um guerreiro renomado, conhecido até mesmo por outras tribos. Além disso, Tanba, outro irmão de Tsiha, estava explicando a situação para as demais tribos. Graças a isso, eles não precisavam se preocupar em ser emboscados pelos runarukas.

Não demorou muito para que começasse a chover. A caminhada até o ninho dos dragões, que levaria cerca de dois dias, mais parecia um passeio agradável. Eles até tiveram tempo de se animar ao ver pássaros incomuns ou se assustar com cogumelos tão brilhantes que pareciam venenosos.

Honey Den, que haviam trazido como guia apenas por precaução, parou em determinado ponto e disse: — Daqui pra frente, fica perigoso pra caramba...

Eles não precisavam que ele dissesse isso.

Bastava olhar para a montanha para qualquer um hesitar.

Olhando-a horizontalmente, era mais ou menos uma mesa. Poderia ser chamada de caldeira. O topo provavelmente havia explodido em uma erupção, deixando uma cratera bastante profunda. Praticamente não havia sopés, e a superfície da montanha possuía uma inclinação bem íngreme. Além disso, era razoavelmente alta, tornando a escalada difícil, mesmo com equipamentos especializados.

Se não fosse por uma fenda estreita na encosta, provavelmente ninguém conseguiria entrar na montanha. No entanto, essa fenda também parecia claramente perigosa. Tinha largura suficiente para permitir a passagem de uma pessoa, mas sua altura ultrapassava facilmente cem metros, talvez até centenas, dando-lhe um aspecto estranhamente apertado.

Além disso, do outro lado da fenda, tudo era pura escuridão. Eles não faziam a menor ideia do que havia lá dentro.

Por um lado, parecia possível entrar, ou melhor, não havia dúvidas de que fisicamente era possível. Mas, ao mesmo tempo, emanava uma sensação de proibição, como se de maneira alguma devessem atravessar aquele limiar.

Tsiha e Mwadan não tentaram se aproximar da fenda e apenas observavam Haruhiro e sua party à distância. De qualquer forma, os runarukas tinham um tabu contra entrar no ninho, então esse era o momento de se separarem. Se fossem pensar bem, a party deveria se sentir grata por eles terem os acompanhado até ali.

Haruhiro ergueu os olhos para a fenda. Sentiu algo apertando na altura do estômago, como se estivesse sufocando.

Já passou um pouco do meio-dia. — Kuzaku olhou para o céu. — Vamos assim mesmo?

Momohina já estava um pouco à frente, dentro da fenda, observando tudo com curiosidade.

Hum, hum, hum...?

E-eu não vou entrar, tá bom?! — Honey Den sentou-se no chão. — Eu já voltei atrás logo no começo quando vim aqui! Não vou ser de nenhuma ajuda!

Então, suponho que não precisamos mais de você, não é? — Setora comentou friamente.

Honey Den se jogou no chão, batendo a cabeça contra ele em uma dogeza desesperada.

Para com isso! Não fala assim! Eu imploro!

Por sinal, suas mãos ainda estavam amarradas atrás das costas. Da única vez que haviam soltado ele, o sujeito tentou fugir imediatamente.

Mary parecia tentar enxergar através da escuridão enquanto analisava a fenda com cuidado. Ao seu lado, Yume fazia alongamentos repetidos, soltando um “Nuuu” ao se esticar bastante.

Kiichi foi até os pés de Momohina, cheirou repetidamente e soltou um “nyaa”.

Os dragões saíram esta manhã. — Shihoru lançou um olhar para Haruhiro.

Haruhiro assentiu e respirou fundo.

Vamos?

Giancarlo e Jimmy haviam ficado em Roronea. Como diretor-gerente, Giancarlo precisava cuidar da Companhia Pirata K&K e manter os piratas sob controle. Já Jimmy, sendo mais voltado para trabalhos intelectuais, era mais útil ajudando Giancarlo do que explorando o ninho dos dragões.

Momohina foi na frente, seguida por Haruhiro, Kuzaku, Setora e Kiichi, Mary, Shihoru e Yume, caminhando em fila única, nessa ordem. Momohina carregava uma lamparina, enquanto Haruhiro levava o saco com o ovo de dragão no ombro.

Adeus, seus bostinhas! Espero que apodreçam!

A voz grossa ecoou atrás deles. Quando se viraram, viram Honey Den pulando e rindo.

Mas que... — Setora disparou atrás dele.

Honey Den soltou um gritinho e correu feito um coelho assustado. Talvez tenha esquecido que Tsiha e Mwadan estavam esperando do lado de fora.

Oooh...?! Ei, para, o que você está fa-

Bem feito. — Mary murmurou.

O que aconteceria com Honey Den no fim das contas? Bem, quem se importava? Melhor nem pensar nisso.

A party seguiu pela fenda. Ela não era exatamente sinuosa, mas também não era reta. O solo era relativamente plano. O ar estava um pouco frio e úmido. Não havia vento.

Será que ele tinha claustrofobia ou algo assim? — Kuzaku sugeriu.

Haruhiro pensava na mesma possibilidade. O que, afinal, havia assustado tanto Honey Den? Até agora, nada parecia tão perigoso.

Momohina continuou avançando.

Alguma coisa... caiu? — Shihoru ergueu a voz. De fato, havia um som além dos passos deles.

Momohina parou e virou a lamparina para trás.

Kiichi soltou um grito agudo, e Shihoru engoliu em seco, agarrando-se a Mary. Entre Shihoru e Yume, havia uma coisa fina e contorcida.

Yume recuou.

Uma cobraaa...? Talvez...?

Não sei... — Haruhiro estreitou os olhos.

A coisa era escura e lembrava uma cobra, mas também parecia um inseto. Só que, ao contrário de centopeias ou lacraias, não tinha muitas pernas. Na verdade, ele não via pernas nenhuma. Além disso, era muito maior que uma centopeia comum, facilmente com mais de um metro de comprimento.

Não parece uma cobra. — Setora se preparou e olhou para cima. — Se caiu de cima, isso significa que-

Ploc. Ploc. Ploc. Ploc.

Uma após a outra, aquelas criaturas finas e compridas começaram a cair, e os gritos ecoaram.

Até Haruhiro se assustou.

Whoa?!

Algo caiu em sua cabeça. Era pesado. E pinicava. Ele saltou, tentando se livrar da coisa. Quando conseguiu, outra pousou em seu ombro esquerdo, e outra em seu braço direito.

Huaugh?! — Um som estranho escapou de sua boca sem querer.

O que era aquilo? Era assustador, assustador, assustador.

Momohina gritou algo ainda pior: — Nyaa! Tá abarrotado disso aqui!

Abarrotado...? O que ela queria dizer com isso?

A luz da lamparina tremulou, iluminando as paredes da fenda.

As paredes estavam... se contorcendo.

Não.

Aquilo não era rocha ou pedra; eram seres vivos.

Estavam repletas daqueles seres longos e finos, agarrados a elas.

Honey Den havia dito: “Entrar aí dentro... Nenhum homem em sã consciência faria isso.”

Agora fazia sentido. Então era disso que ele estava falando. Justo. Isso aqui é péssimo. Eu quero ir embora.

Gyaaaah! Não desistam! Ataqueeeeem! Vão, vamooooos! — Momohina berrou.

Se Momohina não tivesse dado a ordem, Haruhiro provavelmente teria decidido recuar. E se tivessem recuado, talvez nunca mais tivessem coragem de entrar nessa fenda novamente.

Mesmo sentindo que estava prestes a choramingar, Haruhiro empurrava seus companheiros por trás, incentivando-os a avançar, enquanto ele mesmo se lançava para frente em um estado semiconsciente de desespero.

Temos que ir. Não tem outra escolha. Mas, mesmo que consigamos atravessar essa área infernal e horrível, como vamos voltar? Não vamos ter que passar por aqui de novo? Eu não quero nem pensar nisso.

Gyahhhh! Um entrou pelas minhas costas! — Shihoru gritou com uma voz tomada pelo pavor absoluto.

Haruhiro queria fazer algo por ela, mas um daqueles bichos estava enrolado em seu próprio rosto. Ou seja, ele estava no estado de AHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH. O que era AHHHHHHHHHHHHH? Ele já nem sabia mais.

Tropeçou e caiu contra as paredes. Mas, claro, as paredes estavam cobertas de criaturas finas e compridas. Esse lugar estava entupido delas.

De repente, Haruhiro sentiu como se tivesse alcançado a iluminação. Ele também era um ser vivo, então, no fim das contas, isso não era normal...?

Nem ferrando! Claro que não! De jeito nenhum! Ele queria sair dali. Isso não era como deveria ser! Ele não tinha pensado bem nisso antes!

Eu estava errado, pensou, arrependendo-se do fundo do coração. Quero dizer, Ben dos Olhos Vermelhos era um cara teimoso, mas, no fim, ele era só um pirata. E nós, bem, somos o quê? Soldados voluntários? Ou, tipo, aventureiros experientes, talvez? Ele conseguiu ir e voltar, então, sendo bem sincero, eu meio que esperava que fosse fácil. Bom, mais ou menos. Eu sabia que não deveria baixar a guarda, que não podia subestimar a situação, mas, sério, o Ben conseguiu e a gente não? Isso não fazia sentido, né? Era difícil afastar esse pensamento. E, olha, nossa situação financeira tá uma droga. Se isso desse certo e a gente fizesse uma fortuna, eu ficaria mais animado com o futuro. Em Roronea já foi assim, e em Vele vai ser ainda pior. Se quisermos interagir com a civilização, precisamos de dinheiro. Dinheiro move o mundo. Nunca é demais. Ficar sem é um problema. Mas, bom, se eu não tivesse pensado que daria pra encarar isso, eu nunca teria me oferecido pra ajudar. E meus companheiros também toparam sem hesitar. Acho que todos nós achamos que seria tranquilo.

Quer dizer... nem ferrando.

Nunca imaginaríamos que uma armadilha dessas estava esperando por nós.

Parece que estamos correndo há umas cinquenta horas. Não, não é tanto. Mas parece que já se passaram mais de dois dias. Ou melhor, como se eu tivesse vivido uma vida inteira. Então... minha vida acabou?

Haruhiro disparou em direção à luz. E quando saltou para o outro lado, viu um mundo verde.

Era uma floresta? As árvores e o solo estavam cobertos de musgo, hera ou algo do tipo. Tudo era verde.

Por um instante, Haruhiro ficou atordoado. Mas cada vez que uma daquelas criaturas finas e compridas, ainda grudadas nele, se mexia, a sensação era horrível e fazia sua pele arrepiar.

Droga, droga, droga!

Haruhiro se livrou daquelas criaturas, arrancando-as do corpo e jogando-as para longe. Depois, conferiu se todos os seus companheiros estavam ali.

Kuzaku estava estatelado no chão, perto da saída da fenda, com aqueles bichos ainda se contorcendo ao redor dele. Ele estava bem? Estava, né?

Yume e Shihoru estavam puxando as criaturas uma da outra.

Setora estava agachada, agarrando Kiichi, enquanto mais uma daquelas coisas rastejava em seus ombros. Haruhiro se aproximou, pegou a criatura e a lançou longe. Setora o encarou com um olhar vazio e disse: — ...Oh. Obrigada, Haru. Eu te amo.

Uh... desculpa.

Momohina, por outro lado, parecia completamente bem. Ela já tinha subido em uma árvore coberta de musgo e hera, observando os arredores.

Essa mulher é realmente algo fora do comum. O que será que se passa na cabeça dela...?

A que parecia ter sido mais afetada era Shihoru. Todos estavam machucados, arranhados e cortados, mas, no caso dela, o trauma psicológico parecia ainda pior. Ela tinha dito que um daqueles bichos entrou pelas costas... Suas roupas estavam um desastre. Provavelmente, ela mesma as rasgou para se livrar da criatura. Suas roupas estavam em pedaços. Shihoru estava encolhida, tremendo, em um estado... indecente.

Haruhiro tirou sua capa e colocou sobre ela. Shihoru não reagiu. Seu corpo estava ali, mas sua mente parecia ter ido para bem longe. Ele esperava que ela voltasse logo... Mas talvez fosse pedir demais. Sim, provavelmente. Claro que era...

Deixando Shihoru aos cuidados de Yume e Mary, Haruhiro foi ajudar Kuzaku. Ele tinha mais de trinta daquelas criaturas grudadas nele, o que tornava a tarefa difícil. Enquanto ainda tentavam removê-las, Setora apareceu para ajudar.

Esquece o que eu disse antes — ela comentou.

Certo. Hum, desculpa...

Quando todos já conseguiam se mover, Momohina desceu da árvore e seguiu adiante, liderando a party. Tudo ao redor era verde, exceto pelo céu, o que tornava impossível saber a direção exata. Mas, quanto mais se afastavam da fenda, mais perto deveriam estar do ninho dos dragões. Provavelmente.

Depois de um tempo, chegaram a um lago assustadoramente azul. Parecia suspeito demais, então decidiram contorná-lo e seguir em frente. Mais adiante, encontraram um rio... azul demais. Pelo menos, parecia um rio, mas sua água não fluía. O azul era tão intenso que parecia ter sido pintado ali. Claramente estranho. Algo não estava certo.

Ainda assim, eles precisavam atravessá-lo para continuar. Não havia outra escolha?

Haruhiro se ofereceu para ir na frente e pediu que os outros esperassem enquanto ele se aproximava do rio azul. Quando estava a apenas um passo de distância, ondas se formaram na superfície, e algo azul emergiu da água.

Haruhiro quase gritou, mas segurou o impulso, sacando sua adaga enquanto recuava.

Delm, hel, en, balk, zel, arve! — Momohina conjurou o feitiço Blast, explodindo a criatura.

Isso foi ótimo, mas... Haruhiro foi atingido pelos respingos de um líquido azul, pedaços de carne e sabe-se lá mais o quê. E estava quente. Muito quente. Seu corpo começou a soltar vapor.

Espera... Isso está derretendo?! Era algum tipo de ácido poderoso?!

E, pior, mais e mais daquelas criaturas azuis estavam saindo do rio.

Recuem! Recuuuuem! — Momohina gritou.

Eu concordo totalmente com essa estratégia, mas... eu estou queimando aqui, sabe?!

No entanto, Haruhiro não podia simplesmente ficar ali se queimando. Com todas as forças, rastejou para longe, enquanto suas roupas chamuscavam e seu corpo parecia dissolver.

Depois de uma longa fuga, quando finalmente despistaram as criaturas azuis, Mary lançou Sacrament nele. Apesar do calor intenso que sentira, ele não havia derretido tanto quanto pensava. Ainda assim, suas roupas estavam cheias de buracos.

Ohh, sexy! Isso aí! — Momohina mostrou um joinha para tentar animá-lo, mas não serviu de consolo nenhum.

Aquele lago e aquele rio azuis eram perigosos. Eles precisariam evitá-los. Mas... seria possível chegar ao ninho dos dragões sem atravessar o rio?

Eles analisaram várias possibilidades e concluíram que não seria impossível subir até as copas das árvores e avançar pulando de galho em galho, de árvore em árvore. Como aquela era uma área inexplorada, os troncos das árvores eram não apenas grossos, mas seus galhos também eram largos e robustos. Além disso, graças ao musgo, à hera e outras plantas, os galhos se entrelaçavam em alguns pontos, o que ajudava a sustentação.

Dito isso, atravessar pelas copas das árvores trazia seus próprios desafios. Em alguns trechos, era como caminhar sobre uma corda bamba, e em outros, era preciso saltar de um galho para outro. E, se alguém caísse... bem, o rio azul estava logo abaixo. Emoção garantida.

Mais tarde, perceberam outro problema: havia um bom número de criaturas parecidas com macacos—ou melhor, criaturas que provavelmente eram macacos—saltando de galho em galho. E isso fazia os galhos balançarem, o que era assustador.

Sem falar nos sons irritantes que faziam: Ook, ook, ook. Mesmo que não fosse essa a intenção, parecia que estavam zombando deles.

Ao anoitecer, Haruhiro e os outros avistaram as sombras dos dragões. Provavelmente, eles haviam retornado ao ninho. Como já estava escuro, decidiram descansar no chão, não nas árvores.

Exceto Momohina.

Não é sempre que se tem essa oportunidade, entãooo... — ela disse, decidida a dormir lá no alto.

Faz o que quiser, pensou Haruhiro.

Com Shihoru e Kuzaku completamente exaustos, deixaram que descansassem durante a noite. Haruhiro, Yume, Mary, Setora e Kiichi se revezariam na vigia.

Haruhiro ficou com o primeiro turno.

Os macacos tagarelavam ao longe. Eram mesmo macacos? Ele achava que sim. Provavelmente. Eram barulhentos durante o dia, mas também eram ativos à noite?

Estava escuro. Não, mais que isso. Estava praticamente um breu total. Se algo tentasse se aproximar sorrateiramente, ele provavelmente não perceberia. Isso era perigoso. Mas eles estavam no limite da exaustão. Não dava para seguir em frente naquela escuridão.

Acender uma fogueira? Se fizessem isso, seria como gritar para o mundo que havia gente estranha ali. Não parecia uma boa ideia.

Restava apenas esperar, lutando contra as próprias paranoias e tentando se manter alerta.

Quantas noites como essa ele já havia passado? Estava acostumado, mas não deixava de ser difícil. Era difícil, mas, felizmente, o tempo não parava. Por mais devagar que parecesse, ele sempre avançava.

Haruhiro enfiou a mão dentro da gola da camisa e puxou um objeto achatado. Ele estava preso a uma corrente, que ele sempre mantinha no pescoço.

Claro, agora ele não brilhava. Quando tinha sido a última vez que brilhou? Antes, a parte inferior emitia uma luz verde.

Estranho... Por impulso, ele o sacudiu. Depois, sacudiu mais algumas vezes perto do ouvido. Será que ouviu um som fraco dentro dele?

Será que quebrou...? — murmurou.

No instante em que disse isso, ouviu alguém chamar seu nome: — Haru?

A surpresa foi tão grande que ele quase teve um infarto.

Em um reflexo, Haruhiro enfiou o receptor de volta dentro da camisa.

Ah... Você já acordou...? — Ele começou a se levantar, mas acabou sentando de novo.

Mary sentou-se ao lado dele.

É minha vez de ficar de vigia. Você devia dormir.

...Sim. É mesmo. Mas não sei se consigo.

Eu consegui, surpreendentemente. Acho que sou meio desligada.

Nada disso. Você só estava cansada, com certeza.

Isso vale pra todo mundo. De qualquer forma, deita um pouco. Mesmo que não durma, só de descansar já ajuda.

Sim... — Ele respondeu, mas, por alguma razão, não se mexeu.

Será que não queria se mover? Ele se perguntou.

Mary ficou em silêncio. Não insistiu para que ele deitasse.

Quando ele se mexeu um pouco, seu ombro encostou no dela. Eles estavam tão perto assim? Ele se surpreendeu. Seu coração disparou. Precisava se manter alerta. Sim. Ficar atento.

Haru... — ela murmurou suavemente.

Não posso ficar parado. Isso não está certo.

Haruhiro se apoiou mais no corpo de Mary, como se quisesse encostar a cabeça no ombro dela. Ele temia que ela se afastasse.

Mas ela não se afastou.

Mary, então, roçou o rosto contra a cabeça de Haruhiro.

Ahh, eu queria ficar assim...

Gostaria de poder dormir desse jeito.

Ele não disse nada, mas, como se tivesse lido seus pensamentos, Mary assentiu levemente.

Por alguma razão, ele se lembrou de Setora dizendo: “Haru. Eu te amo.”

Seu peito doeu.

Mas, ao mesmo tempo, pensou: Eu te amo. Mary, eu te amo.

Ele deveria dizer isso em voz alta. Com certeza, deveria.

Mas, no exato momento em que tentou—

Aaaahhh! — Momohina gritou lá do alto das árvores.

O quê?! Ela estava falando dormindo? Não, não era isso.

Momohina lançou algo das árvores. Aquilo caiu perto de Kuzaku, que soltou um grito: — Whah?!

Ele saltou de susto, e o resto da party acordou um após o outro.

Cuidado! Podemos estar cercados! — Momohina gritou.

Algo os estava atacando.

Não sabiam o quê.

A escuridão era total.

Mesmo assim, Haruhiro e os outros lutaram com tudo o que tinham.

Os inimigos eram estranhos. Provavelmente eram criaturas peludas, mas não emitiam nenhum som, nem mordiam, nem arranhavam. Apenas avançavam contra eles, como se tentassem empurrá-los.

Não eram golpes fortes, e a sensação era meio... macia?

Não chegava a ser um impacto de verdade, então não era difícil desviar ou afastá-los. Mas eles não desistiam. Continuavam vindo, um atrás do outro.

No fim, Momohina perdeu a paciência.

Nyahahh! Delm, hel, en, balk, zel, arve!

Sua magia Blast explodiu, revelando a verdadeira identidade dos inimigos.

Cabelos.

Eram cabelos.

Só podia chamá-los assim.

Monstros de cabelo estavam espalhados por toda parte.

Com a explosão, os monstros se dispersaram, como a maré recuando, mas logo avançaram de novo.

Mesmo quando Momohina lançou outro Blast, eles voltaram depois de um tempo. Não havia como lidar com aquilo.

Haruhiro tentou agarrar um deles e apunhalá-lo com sua adaga, mas, por mais que golpeasse, sentia que só estava cortando cabelo.

O pior era ver os fios cortados se contorcendo no chão. Aquilo era horrível.

Os monstros de cabelo continuaram pressionando a party até o amanhecer.

E, no início da manhã, durante o ataque final, enquanto os monstros peludos fugiam, Haruhiro percebeu algo.

Ele achava que cada um daqueles monstros era uma entidade separada.

Mas então viu uma cena estranha: enquanto fugiam, alguns fios de cabelo se juntavam a outros, que por sua vez se uniam a mais fios, formando uma única massa que se afastava da party.

Isso significava o quê?

Que diabos eram essas coisas...?

Enquanto tentava entender, um pensamento inquietante surgiu em sua mente.

Era melhor não continuar pensando nisso.

Graças aos monstros de cabelo, Haruhiro não conseguiu dormir nem um pouco, mas não tinha escolha. Precisavam chegar ao ninho dos dragões, devolver o ovo e sair dali o mais rápido possível.

A party acelerou o passo.

O cansaço era tanto que ele se sentia estranhamente alerta, mas... e daí?

Pensa bem: havia alguma coisa nessa vida que não fosse difícil?

Talvez. Mas eram poucas, não?

No fim das contas, passava mais tempo sofrendo do que o contrário.

Além disso, havia vários tipos de sofrimento.

E esse era um daqueles que ele ainda podia aguentar.

Não sentia que era algo impossível de superar.

Pela manhã, três dragões alçaram voo.

O que estaria acontecendo com Roronea?

Agora não era o momento para pensar nisso.

Na parte da manhã, Yume pisou em uma cobra completamente branca, com mais de dez metros de comprimento, e quase foi engolida inteira.

Kuzaku caiu de uma árvore, fazendo os macacos caírem na risada, e depois foi perseguido por uma criatura parecida com um caranguejo-eremita gigante.

Shihoru desmaiou, e Kuzaku torceu as costas ao carregá-la, forçando Mary a curá-lo.

Fora isso, nada de mais aconteceu.

Durante a tarde, um enxame de borboletas, ou mariposas, ou algo com mais de um metro de envergadura os atacou.

Tentaram subir em uma árvore para escapar, mas a árvore, na verdade, era um aglomerado de insetos verdes parecidos com baratas.

No pânico, ao fugirem deles, Haruhiro, Kuzaku e Yume caíram em uma fenda infestada de insetos e passaram por um verdadeiro pesadelo.

A experiência fez Haruhiro concluir que jamais chegaria o dia em que ele conseguiria rir daquilo e dizer: “Ha ha ha, quem diria que eu preferiria tomar um banho de verdade a ser banhado por insetos?”

Eles encontraram uma criatura que disparava projéteis parecidos com lanças de sua boca e ficaram chocados ao ver um desses projéteis atingir um macaco no topo das árvores.

E, claro, logo em seguida, eles próprios foram atacados e forçados a lutar.

O dia inteiro foi uma sucessão de desgraças.

Mesmo assim, conseguiram fazer pequenas pausas e evitar o esgotamento total.

Eram viajantes experientes, afinal de contas.

Sabiam que isso era essencial.

Antes do anoitecer, avistaram os dragões retornando ao ninho.

Eles pareciam bem grandes, o que indicava que o ninho não estava longe.

Não dava para dizer se estavam muito perto, mas com certeza estavam chegando.

Achando que os monstros de cabelo poderiam aparecer de novo, continuaram avançando com cautela, mesmo após o pôr do sol.

Naturalmente, precisaram acender uma lamparina.

Cobriram a luz, tentando iluminar apenas o caminho à sua frente.

Mas, em determinado momento, já não precisaram mais da lamparina.

Um número inacreditável de insetos brilhantes, como vagalumes, começou a voar ao redor deles.

São só insetos, né?

Com essa dúvida na cabeça, Haruhiro tentou pegar um deles.

O inseto desapareceu—luz e tudo.

É um fenômeno sobrenatural, huuuuh — Momohina riu, divertida. — Heh heh heh!

Enquanto Momohina ria, Kuzaku e Shihoru pareciam genuinamente aterrorizados.

A forma como aquelas incontáveis luzes azuladas piscavam e iluminavam fracamente a floresta verde criava um cenário misterioso e belíssimo.

Tão belo que causava arrepios.

Mas havia algo de assustador nisso.

Afinal, o que eram aquelas luzes?

Um fenômeno natural?

Ou realmente sobrenatural, como Momohina sugeriu?

Seriam almas errantes...?

Esse pensamento cruzou a mente de Haruhiro.

As luzes estavam assumindo formas humanas.

Eram figuras humanoides que pareciam... estar seguindo a party?

Elas estavam aumentando em número?

Era só impressão dele?

Não, né...?

E-E-E-Esse é um fenômeno u-u-u-um tanto i-i-i-inquietante, n-n-n-não acham...?

Para a surpresa de Haruhiro, Setora estava assustada.

Se perguntasse diretamente, ela provavelmente negaria.

Mas seus joelhos tremiam.

E, por causa disso, ela cambaleava o tempo todo, quase tropeçando várias vezes.

Aqui, cuidado. — Mary tentou segurá-la.

N-N-Não se meta comigo.

No mesmo instante, Setora tropeçou.

Mary a segurou antes que ela caísse.

Depois disso, Setora parou de recusar ajuda e as duas passaram a caminhar apoiando-se uma na outra.

Quando a party parava para descansar, as massas de luz também paravam.

Quando voltavam a andar, as massas de luz os acompanhavam.

O que eram essas coisas...?

Então, quando a noite chegou ao fim—

Todas aquelas incontáveis luzes desapareceram num instante, como se nunca tivessem estado ali.

A party olhou ao redor, tomada por choque e admiração.

A floresta não era mais verde.

Era laranja.

Mais do que isso—

Ela continuava mudando.

Conforme avançavam e o sol subia mais alto, mais brilhante, as árvores, o chão, tudo, exceto o céu azul-claro, tornava-se amarelo.

Um amarelo intenso.

Depois do que aconteceu com as luzes na noite anterior, parecia que haviam vagado para outro mundo.

Espera aí... será que morremos em algum momento?

Isso aqui não é só outro mundo, mas o mundo pós-morte?

Haruhiro se perguntou.

Entre as árvores amarelas, avistaram uma montanha amarelada-esverdeada, ou verde-amarelada.

De lá, viram três dragões decolarem, um após o outro.

Isso foi o suficiente para convencer Haruhiro de que ainda estavam vivos.

Espera aí.

Ele parou no meio do caminho.

O ninho.

O ninho dos dragões ficava no topo daquela montanha amarelo-esverdeada.

Eles já estavam dentro da caldeira de um monte, mas havia outra montanha ali.

Amarelo-esverdeada, também.

E realmente linda.

Era mais uma prova de como aquele território era desconhecido.

Não faziam ideia do que mais os aguardava.

Mas tinha que haver coisas ainda mais incríveis do que tudo que tinham visto até agora.

Seria impossível que não houvesse.

Seria estranho.

Insano.

Mas seguiram em frente, e nada aconteceu.

O mais incrível é que chegaram à Montanha Amarelo-Esverdeada por volta do meio-dia.

(Como era uma montanha amarelo-esverdeada, chamaram-na de Montanha Amarelo-Esverdeada.)

A olho nu, parecia ter cerca de quatrocentos metros de altura.

Pequena, para uma montanha.

A inclinação não era íngreme.

Dava para subir em, mais ou menos, duas horas.

Se nada desse errado, claro.

Era meio-dia.

Se subissem agora, conseguiriam ir e voltar antes do anoitecer.

Com sorte, os dragões não voltariam para o ninho enquanto a party estivesse lá dentro...

Era melhor esperar até a manhã seguinte?

Dormir ali, partir ao amanhecer, logo depois que os dragões saíssem?

Se levassem um dia a mais, haveria ainda mais baixas.

Não tinham como saber se os dragões interromperiam a destruição depois que o ovo fosse devolvido.

Mas isso era um problema para depois.

Já tinham chegado até ali.

Só restava fazer o que podiam o quanto antes.

Era simples assim.

A subida na Montanha Amarelo-Esverdeada foi tranquila.

A vista do alto era simplesmente de tirar o fôlego.

Lá de cima, tendo a Montanha Amarelo-Esverdeada como centro, viam as árvores amarelas formando um imenso tapete, como um campo florido em plena floração, cercado por uma floresta de um verde tão vibrante que parecia irreal.

Os runarukas chamavam toda essa região de ninho dos dragões.

Só por essa vista, a jornada já tinha valido a pena.

Mas Haruhiro não queria voltar ali nunca mais.

E queria acabar com essa missão o mais rápido possível para poder ir para casa.

Não que estivessem correndo—

Era uma montanha fácil de escalar, então chegaram ao cume na metade do tempo esperado.

E logo encontraram o ninho.

Ou melhor, a entrada do ninho.

No pico da Montanha Amarelo-Esverdeada havia um buraco aberto.

Grande o bastante para que dragões passassem por ele.

Tinha, provavelmente, uns quarenta metros de diâmetro.

Era um poço vertical, arredondado, com leves deformações.

Ao olhar para dentro, dava para ver algo que parecia ser o fundo.

Não com clareza.

Era bem fundo.

Com certeza, mais de cem metros.

Não dava para descer dali.

Não era apenas um penhasco.

Havia trechos onde era ainda pior do que um simples desfiladeiro.

Se tentassem descer dali, só conseguiriam caindo.

E, se caíssem, morreriam.

Shihoru se sentou no chão, exausta.

O que... fazemos agora...? — Sua voz parecia prestes a se apagar.

Hm... — Kuzaku cruzou os braços e gemeu.

Setora respirou fundo e então balançou a cabeça.

Kiichi estava a seus pés, piscando os olhos.

Mary tinha uma expressão complicada no rosto.

Haruhiro quase não conseguia parar de olhar para ela, mas virou o rosto às pressas.

Yume e Momohina estavam lado a lado, na beira do precipício, espiando o fundo do buraco.

Deve haver outro jeito.

Haruhiro assentiu para si mesmo.

Era impossível que não houvesse.

Tinha que haver.

Com certeza.

Estamos deixando passar algo. Ou melhor, nem sequer procuramos por isso. Em algum lugar na encosta da montanha, deve haver um caminho lateral que leva ao ninho. Só precisamos encontrar.

Não havia garantia de que conseguiriam atravessar esse caminho ilesos.

E, além das dificuldades na ida, a volta também seria um problema.

O risco era tão grande que ele preferia nem pensar nisso.

Mas escolheu ignorar tudo isso de propósito.

Superariam cada obstáculo um de cada vez, avançando passo a passo.

Foi assim que chegaram até ali.

E fariam o mesmo agora.

Haruhiro queria dividir a party para a busca.

Mas, se se separassem, não teriam como se comunicar.

Sem falar no risco de alguém se perder.

Por isso, decidiram se mover juntos, espalhando-se o máximo possível sem perder contato visual uns com os outros.

Mesmo sendo uma montanha pequena, levaria tempo para vasculhar cada canto.

Seria bom se tivessem pelo menos alguma pista de onde procurar.

Se o fundo do ninho ficava a mais de cem metros de profundidade, então o caminho lateral que levava até ele não poderia estar tão alto.

Mas também não fazia sentido que ficasse na base da montanha.

Melhor começar explorando a área intermediária.

Nessas situações, Kiichi, o nyaa cinzento, costumava ser mais útil do que qualquer humano.

Deixaram Kiichi agir livremente, confiando que ele daria um jeito de avisá-los se encontrasse algo.

Tudo resolvido, começaram a descer do cume para iniciar a busca—

Quando um grito estridente e, de certa forma, até fofo, ecoou pelo ar.

Pigyaaaahhhhh!

Haruhiro virou os olhos para o ninho.

Não queria olhar.

Mas não tinha como não olhar.

Então olhou.

E, diante dele—

Uma criatura surgiu do buraco no ninho, batendo as asas.

A única coisa que conseguiu pensar foi: De jeito nenhum.

O que aquilo estava fazendo ali?

Três dragões haviam partido, não?

Mas, pensando bem, eles só sabiam que havia mais de um dragão.

Nunca souberam exatamente quantos.

O que significava que, na verdade, eram quatro.

Só que...

Ele é pequeno.

Mesmo com as asas abertas, sua envergadura mal chegava a quatro ou cinco metros.

Ainda era grande, mas comparado aos dragões que estavam atacando Roronea, era impossível não pensar: Que coisinha minúscula.

A cabeça também parecia estranhamente grande.

O corpo era pequeno, quase infantil.

O voo era desajeitado.

Batia as asas o mais rápido que podia, mas subia devagar.

Ainda assim, o pequeno dragão esmeralda já estava a uns vinte, trinta metros de altura, observando Haruhiro e a party.

Ah... ah... AHHHHHHHHHHHHHH!!

O grito de Kuzaku veio tarde demais.

Haruhiro-kun?! — Shihoru exclamou.

Haru?!

Haru!

Haru-kun?!

Um a um, seus companheiros chamaram seu nome.

Não olhem pra mim como se eu soubesse o que fazer.

Ele queria se virar para Momohina e esperar ordens.

Mas tinha um orgulho a manter como líder.

Ou não.

Na verdade, não tinha muito orgulho, não.

Mas a dura realidade era que ele era o líder.

E agora? Mesmo sendo pequeno, ainda era um dragão.

E estava voando.

Se lutassem contra ele e, por sorte, vencessem... e depois?

Aquele devia ser um dragão jovem.

Vieram até ali para devolver o ovo e acalmar a fúria dos dragões.

Matar um filhote seria um desastre.

Não havia escolha a fazer.

Só havia uma opção.

Corram...! Separem-se!

Todos saíram em disparada pela Montanha Amarelo-esverdeada.

Mas, apesar do que Haruhiro disse, ele seguiu atrás de Shihoru.

Os outros ficariam bem.

Provavelmente.

Ao olhar para trás, viu o pequeno dragão gritar: Pigyahhhhhhhhhhhh!

Mas não atacou.

Permanecia no mesmo lugar.

Aquilo quase fez Haruhiro diminuir o ritmo.

Mas não.

O filhote continuava gritando: Pigyahhhhhh! Pigyahhhhhh!

Sem parar.

Aquela voz ecoava longe.

Será que...?

Não podia ser.

Mas e se fosse?

E se estivesse chamando os outros três dragões de volta?

Se fosse esse o caso, quanto tempo levaria para que chegassem?

Era bem mais rápido descer do que subir.

Haruhiro e Shihoru estavam atrás dos outros, mas ainda assim demoraram menos de uma hora para chegar ao sopé da montanha.

Mesmo assim, o pequeno dragão continuava gritando: Pigyahh! Pigyahh!

Pouco antes de mergulharem na floresta amarela, Haruhiro viu silhuetas no céu ao sul.

Dragões.

Depois que entraram na mata, as árvores obstruíram a visão, mas ele tinha certeza.

Agora o que fazer?

Esconder-se?

Ou correr muito, muito mais longe?

Ele precisava decidir.

Se fossem se esconder, havia algum lugar para isso por perto?

Se continuassem fugindo, teriam forças para isso?

Estavam todos exaustos.

Aquilo era o que significava não ter saída.

Então, veio um rugido estrondoso.

Um dragão passou voando bem acima da party.

Gyohhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!

Ainda estava acima das copas das árvores, mas a sensação era de que roçava suas cabeças.

Tá vindo! — alguém gritou.

Shihoru não se movia.

As pernas dela estavam travadas de medo?

Haruhiro a puxou pelo braço e correu.

Mas correr...

O que isso adiantaria?

O dragão estava vindo.

Dessa vez, para valer.

Por trás deles.

Mudara de direção e mergulhava rápido.

Haruhiro empurrou Shihoru para o lado e se virou.

Ele sabia que estava vindo em sua direção. Mas não que estivesse tão perto.

O dragão derrubava árvores para pousar.

Era bem na frente dele.

Uma nuvem de poeira subiu.

Haruhiro foi jogado longe.

Girou uma vez.

Duas.

Droga, vai pisar em mim!

Ou pelo menos pensou algo assim.

Não lembrava direito.

Apenas tinha consciência de que estava segurando o dragão pela perna traseira direita.

O dragão rugiu: Agyooooooooooooon! E começou a se debater.

Haruhiro seria lançado longe em segundos.

Ele não queria particularmente se agarrar a um dragão, mas tinha certeza de que morreria se o soltasse.

Instintivamente, puxou a adaga flamejante e a cravou nas escamas.

Uma lâmina comum talvez não perfurasse.

Mas essa não era comum.

Penetrou fundo.

E não saía.

O dragão saltava e pisoteava o chão.

Haruhiro segurou firme no cabo da adaga com a mão esquerda.

E puxou a outra adaga com a direita.

Essa outra adaga também era uma criação dos buracos dos anões.

Ela... poderia fazer isso.

Em teoria.

Ele a cravou.

Boa, entrou.

Foi então que aconteceu.

Uwah!

O dragão dobrou as pernas.

Como quem se prepara para um salto.

Espera... vai voar? Devo soltar?!

Tarde demais.

No instante em que o dragão pulou, sentiu o corpo flutuar.

Rápido.

Rápido demais.

O impulso foi avassalador.

Em um piscar de olhos, já estava no céu.

Bem acima das árvores.

A diferença entre aquele filhote e esse dragão era clara.

A força com que batia as asas era absurda.

Wahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh...!

Haruhiro gritou sem nem perceber.

Pensou em olhar para seus companheiros.

Mas era impossível.

Estava no céu, afinal.

Voando também.

Estaria a cem metros de altura?

Mais?

O dragão mantinha as pernas ligeiramente dobradas enquanto voava.

Talvez, se as movimentasse demais, perdesse o equilíbrio.

Graças a isso, contanto que Haruhiro segurasse firme na adaga flamejante, parecia que não cairia.

Pelo menos enquanto conseguisse se segurar.

Mas isso não era nada fácil.

Quando cravou as adagas nas escamas do dragão, desistiu de se agarrar à perna dele.

Diferente da perna de um humano, aquela era grossa como o tronco de uma árvore gigante.

Nem teria conseguido se agarrar nela por muito tempo, de qualquer forma.

Ou seja, a única coisa impedindo que caísse era a força com que segurava as adagas.

O vento golpeava seu corpo inteiro.

A força era absurda.

Ia ser arremessado a qualquer momento.

Era um milagre ainda estar ali.

Ou talvez não.

Se fosse jogado longe, morreria na hora.

Por isso, segurava-se com tudo o que tinha.

Alto.

Alto demais.

Quantos metros haviam subido?

Centenas?

Milhares?

Mais?

Inacreditável.

Dali, podia ver toda a Ilha Esmeralda.

E outras ilhas também.

Era um nível completamente diferente de medo.

Embora, sim, fosse assustador.

Muito.

Por quanto tempo mais conseguiria aguentar?

Não sabia.

Cada vez que o dragão batia as asas, ele era chacoalhado.

Sentia o corpo se rasgar.

Não apenas o físico, mas sua própria existência.

Então, o dragão começou a subir e descer bruscamente.

Não dava mais.

Não aguentava mais.

Queria gritar que não conseguia, que já tinha chegado ao limite.

Mas apenas continuou segurando.

De repente, o dragão começou a girar, tanto na horizontal quanto na vertical.

Tá tentando me matar? Já chega! Por favor! Para com isso!

Implorava mentalmente, mas só podia continuar se segurando.

Foi então que a mão esquerda escorregou do cabo da adaga flamejante.

Acabou-se. É o fim. Tô morto.

Ou assim pensou.

Mas, quando o dragão fez uma curva após isso, seu corpo balançou violentamente.

Aproveitando o impulso, esticou a mão esquerda e conseguiu agarrar o cabo da adaga flamejante de novo.

Sentiu um pequeno alívio.

Mas, ao mesmo tempo, ficou exausto.

O quê? Ainda não acabou? Se fosse para acabar, que acabasse logo. Seria mais fácil. Ele já estava farto.

Pensou em seus companheiros.

Mas isso não fez com que criasse forças para continuar.

Então, por que ainda estava segurando?

Não era o suficiente?

Já tinha feito tudo o que podia.

Mais do que qualquer um esperaria dele.

Se morresse ali, não teria arrependimentos.

...Será?

Decidiu parar de pensar nisso.

Ou talvez, simplesmente, já não conseguisse mais pensar.

Ocasionalmente, soltava gritos como: “Wahh!”, “Ohhh!”, “Gweee!”

Por várias vezes, uma de suas mãos se soltava do cabo da adaga.

E, de alguma forma, ele sempre conseguia recuperá-la.

Nem sabia como.

Só sabia que, no momento seguinte, já estava segurando firme de novo.

O mar era lindo.

Tão azul.

Em algum momento, tinham saído sobre o oceano.

O dragão agora planava, inclinando o corpo levemente.

E descia, aos poucos.

Ali...

Era uma cidade?

Na Ilha Esmeralda, havia apenas uma cidade.

O dragão estava indo do mar em direção a Roronea.

Passou sobre os píeres e cais destruídos.

Dos antigos armazéns, mal restavam traços.

Mais adiante, ficava o distrito comercial.

Também devastado.

O antigo mercado era apenas escombros.

O dragão bateu as asas.

Sua velocidade caiu drasticamente, e o corpo de Haruhiro foi jogado para cima.

Quase soltou as adagas. Ou melhor, queria soltá-las. Mas não conseguia.

Seus dedos, mãos, braços...

Nenhuma parte do corpo obedecia mais.

O impacto do pouso foi avassalador.

Seu corpo inteiro foi sacudido como nunca antes.

Parecia que sua cabeça ia se soltar do pescoço.

Ainda estava consciente.

Sabia que estava ali, apoiando-se nas adagas cravadas na perna do dragão enquanto estava pendurado. Mas não parecia real.

Sensações.

Sim.

Elas não estavam lá.

Estava frio.

Seu corpo inteiro.

Era como se tivesse congelado.

O dragão estremeceu um pouco e emitiu uma vocalização curta e baixa. Woh!

Dava para perceber que o dragão estava tentando dizer algo.

Haruhiro assentiu, respirando pesadamente, várias vezes.

Aos poucos, sua temperatura corporal voltou ao normal.

Se mexeram.

Seus dedos.

Suas mãos.

Seus braços.

Até suas pernas.

Conseguia se mover.

...Calma aí.

Envolveu as pernas na perna do dragão e puxou as adagas com toda a força.

Elas não tinham saído até agora, mas, desta vez, se soltaram.

Haruhiro caiu no chão com as adagas em mãos.

Tentou aterrissar com graça.

Não conseguiu.

Acabou se batendo em vários lugares.

Doeu.

Mas... estava vivo.

...Certo?

Eu tô vivo?

Não tinha certeza.

Olhou ao redor.

Provavelmente, estava na área onde ficava o mercado de Roronea.

Antes, dezenas de barracas e lojas deviam ocupar esse espaço.

Ou mais.

Agora, só restavam destroços espalhados.

O que ele estava fazendo ali?

Há pouco tempo, estava no ninho dos dragões.

Isso era estranho.

Não fazia sentido.

Levantou-se.

O corpo inteiro doía.

Arrastando uma perna, começou a caminhar cambaleando.

Então, virou-se de repente.

O dragão tinha erguido a cabeça e o encarava.

Grande.

Grande demais.

Sério.

A boca do dragão estava fechada.

Suas narinas se expandiam e retraíam conforme respirava, e as escamas brilhavam a cada leve movimento.

Mas, mais do que isso, eram os olhos que chamavam atenção.

Amarelos.

Luminosos.

Eles eram a própria essência da luz.

Como um ser assim poderia existir?

O impacto em seu coração foi avassalador.

Talvez pudesse chamar isso de reverência.

Não dá. Não pode. Uma criatura dessas... Algo tão incrível... Você não pode fazer algo que a irritaria.

Haruhiro puxou o ovo de dentro da bolsa, afastou-se, ajoelhou-se e o colocou gentilmente no chão.

Desculpa. Queríamos devolver isso. Fomos devolvê-lo.

O dragão inclinou a cabeça por um instante e piscou.

O que sentia?

O que pensava?

Ele não tinha a menor ideia.

Provavelmente, o modo como um dragão pensa e sente é bem diferente do de um humano.

Mas, sem dúvida, o dragão sentia algo.

E provavelmente pensava também.

O dragão esticou o pescoço.

Era agora?

Era ali que Haruhiro seria devorado?

Se fosse, não havia nada que pudesse fazer.

A essa distância, não tinha como fugir.

Se ia viver ou morrer, dependia do dragão.

Havia coisas sobre as quais ele simplesmente não tinha controle.

Respirou fundo.

Ficou parado.

O dragão pegou o ovo com a boca.

Ergueu a cabeça.

Com o ovo ainda nos dentes, soltou um som grave e profundo: Ohh, wao, ohh!

Haruhiro se levantou.

O dragão bateu as asas duas, três vezes.

E alçou voo.

O vento o atingiu em cheio.

Foi jogado de costas no chão.

De lá, olhou para cima.

O dragão subia.

E subia.

Haruhiro permaneceu caído, olhando diretamente para o céu.

O dragão circulou Roronea uma vez.

Depois, partiu.

Seguiu para longe.

Até desaparecer de vista.

Haruhiro murmurou para si mesmo: — Tô exausto...



Achou algum erro? Avise a gente!
Este site tem como objetivo divulgar obras e incentivar a compra de materiais originais.
Não hospedamos, distribuímos ou promovemos links para cópias não autorizadas.
Adquira a obra original para apoiar os autores.
Comments

Comentários

Exibir Comentários