Hai to Gensou no Grimgar | Grimgar of Fantasy and Ash Volume 09 Capítulo 09
[Essa é a Minha Decisão]




Ela acordou.

Tsuga, o sacerdote de cabelo raspado, estava agachado bem ao lado dela, alisando o queixo.

Quando Tsuga havia sugerido: Por que não descansa um pouco?, ocorreu-lhe que, se se esforçasse demais, poderia acabar causando mais problemas para ele. Então, ela se deitou e imediatamente adormeceu.

Aquilo tinha sido mais perto do amanhecer do que da meia-noite. Ainda não era meio-dia. Provavelmente era cedo pela manhã. Não tinha dormido muito, mas será que ele havia visto seu rosto enquanto dormia? Essa ideia a deixou constrangida, e Shihoru desviou o olhar, puxando sua franja enquanto se levantava.

Um... Agora há pouco, você ouviu algo?

Ouvi, sim.

Alguma ideia do que pode ter sido aquele som...?

Nenhuma — respondeu Tsuga. — Parecia algum tipo de criatura.

Achei que soou incrivelmente alto...

Mas estava bem longe.

Você acha que está tudo bem?

Quem sabe. — Tsuga inclinou a cabeça de lado e soltou um curto bocejo. — Não sou muito bom em viver na natureza.

...Huh? Mas você é um soldado voluntário.

Sou, mas só porque tenho que ser. Por causa das pessoas com quem me relaciono, dá pra dizer. Se fosse só por mim, eu não faria isso. Se não tivesse me alistado ao mesmo tempo que Rock, e se não tivéssemos feito dupla, eu provavelmente já teria desistido há muito tempo. Quando Rock está por perto, nunca é entediante, e eu diria que o motivo de eu continuar é porque nunca fico entediado.

Essa é sua motivação, ou melhor... seu motivo. Entendi.

Pois é. — Tsuga começou a vasculhar sua mochila, que estava ao seu lado. — E você?

Eu... — Shihoru abraçou seu cajado com força. — Isso era a única coisa que eu podia fazer. Não consigo imaginar outras opções. Então, basicamente, as coisas meio que aconteceram assim. Eu fui com a correnteza, e ela me trouxe até onde estou hoje.

Ainda assim, se eu tivesse desistido, quem sabe? — Tsuga deu de ombros. — Às vezes aparecem caras assim. Um começou a trabalhar com comércio; outro abriu um negócio na cidade livre de Vele. Teve um que foi para o continente do Reino de Arabakia. Me pergunto o que ele está fazendo agora. Será que chegou lá?

...Você conhece muitas pessoas.

Porque estivemos em muitos lugares. Bem, é o Rock, sabe. Pelo tipo de pessoa que ele é... como se chama isso? A vibe de uma pessoa? Não há muitas que combinem com a dele. Se não sente que vai dar certo, Rock logo desiste. Eu não sou exigente, então me dou bem com quase todos com quem já trabalhei, mesmo que tenha sido só uma vez. E, sempre que os encontro, converso sobre o que estão fazendo ou já fizeram.

...Entendi.

Aquele homem era um sacerdote competente. Mas ele era realmente comum. Tão comum que o tornava estranho para um soldado voluntário.

Aparentemente, havia soldados voluntários que trabalhavam sozinhos. Alguns, como Lala e Nono, trabalhavam apenas em duplas. Dito isso, a vasta maioria dos soldados voluntários formava grupo de cinco ou seis pessoas, então a vida era dura para aqueles que não conseguiam trabalhar em equipe.

Trabalhar em uma party era parecido com trabalhar em unidades maiores, como um exército, mas também diferente. Se dezenas, centenas ou mais pessoas fossem agir ou lutar juntas, era necessário manter um certo nível de disciplina. Frivolidade, descuido, imprudência; tudo isso podia atrapalhar essa ordem.

No ponto de vista de Shihoru, se o comandante fosse lógico, inteligente e corajoso, o soldado só precisava ser leal e capaz de suportar.

O comandante dava as ordens corretas, e os soldados as seguiam. Isso era tudo o que precisavam fazer. Na verdade, isso era o ideal.

No caso dos soldados voluntários, isso não era necessariamente verdade. Era necessário um certo nível básico de cooperação e sociabilidade para manter a party unida, mas, além disso, as personalidades e habilidades individuais de cada membro falavam por si. Os soldados voluntários precisavam se adaptar a muitos ambientes diferentes e lidar com toda situação imaginável. Muitos dos mais competentes soldados voluntários não se encaixariam bem como soldados no sentido mais tradicional.

Até mesmo uma voluntária pouco habilidosa como Shihoru enfrentava situações em que precisava tomar decisões por conta própria e superá-las com sua própria força. Sem perceber, ela havia adquirido o hábito de pensar por si mesma, para estar preparada caso o pior acontecesse. Se não fizesse isso, poderia morrer. Ou, pior ainda, permitir que um de seus companheiros morresse em seu lugar.

Essa era uma sensação que ela carregava há muito tempo: os soldados voluntários tendiam a ser muito únicos. Talvez fossem os mais únicos que tivessem mais chances de sobreviver. Mas seria só isso? Ou seria que viver como um soldado voluntário despertava essas peculiaridades?

Quando pensava nisso, seus dias como voluntária pareciam absurdos. Perder pessoas de quem gostava, quase morrer, ver apenas coisas desconhecidas e ir a lugares que nunca havia visto. Era assustador, mas também divertido.

Talvez houvesse mais dias em que ela achava que não viveria para ver o seguinte do que o contrário. Não era como se ela estivesse em constante pânico com a morte, mas, mesmo que não estivesse pronta para morrer, a morte sempre a cercava. Ela não queria ter arrependimentos. O único sentimento que ela não desejava ter ao fim de sua vida era o arrependimento.

Todos deviam sentir o mesmo. Porque nunca podiam saber quando suas vidas terminariam, queriam matar o mínimo de si mesmos enquanto estivessem vivos.

Havia momentos em que a paciência era necessária. Mas eles não queriam passar todo o tempo se contendo. Isso não seria uma perda de tempo? Não pareceria uma grande estupidez?

Eles estavam vivos. Porque, ao contrário daqueles que morreram, ainda estavam vivos.

Quero viver fiel a mim mesma, até o dia em que eu morrer.

Provavelmente era por isso que os soldados voluntários tendiam a seguir seus próprios caminhos. Eles avançavam por suas próprias trilhas com o tempo limitado que tinham.

Mas isso era estranho.

Mesmo que Shihoru não fosse uma voluntária, mesmo que estivesse trabalhando em uma cafeteria em Altana, a verdade era que nada mudaria. Mesmo que não saísse de casa, poderia ser morta em uma invasão dos orcs, ou ser pega em um acidente e morrer de uma forma inesperada. Poderia contrair uma doença incurável. No fim, a morte chegaria, e sua vida terminaria.

Mesmo fazendo coisas perigosas todos os dias, isso não significava necessariamente que morreria cedo, e alguns que tentavam viver da forma mais segura e tranquila possível também não viviam vidas longas. Ainda assim, se tivesse vivido de forma normal, esse pensamento provavelmente nunca teria ocorrido a Shihoru.

Se eu não viver fiel a mim mesma, mesmo que seja por apenas um ou dois dias, seria um grande desperdício.

Mesmo que Tsuga levasse uma vida comum, não como soldado voluntário, talvez ele não mudasse muito. Era assim que Shihoru se sentia.

Talvez isso fosse estranho. Talvez Tsuga realmente não fosse normal. Havia pessoas assim.

Eu... preciso descobrir quem eu sou.

Ela queria ser fiel a si mesma. Mas o que isso significava? Quando pensava nisso, não havia nada que ela pudesse dizer que a representasse. Ela ainda era inexperiente, como soldado voluntária e como pessoa.

Será que ela conseguiria amadurecer?

Será que ela viveria o suficiente para isso?

Shihoru estremeceu e engoliu em seco.

Tsuga-san!

Sim. — Tsuga estava tranquilo, abraçando os joelhos, parecendo completamente calmo. No entanto, ele olhava para cima, movendo a cabeça lentamente de um lado para o outro. — Parece que tem alguma coisa por aí.

Parece...? Você quer dizer que tem, não é?

Acha que é um pássaro?

...Esses gritos não soam como um.

Talvez seja um pássaro bem grande.

Tem algum em mente?

Não. Mas... — Tsuga esfregou a cabeça raspada. Qual seria a sensação disso? Shihoru ficou um pouco curiosa. Porém, a atenção de Tsuga parecia estar focada em outra coisa. — ...Agora que penso, hoje não está nublado. É a primeira vez que acontece desde que viemos para o Vale dos Mil.

...Não acho que bom tempo seja algo ruim.

Normalmente, não seria mesmo. Mas, pela minha experiência, eventos incomuns tendem a vir juntos. O que será? Tipo, o chão endurece depois da chuva, e isso é bom, mas quando chove no deserto, vira uma tempestade imensa. Tem relâmpagos, granizo, e depois começa a chover flechas e lanças. Já passei por muitas coisas assim. Ah, lá está de novo...

À distância, algo gritou: Pigyaaaaaaaaaahhhhhhh!

Era algo ameaçador, e o som irritava os ouvidos.

Hum... — começou Shihoru.

O quê?

Eu só estava pensando... É seguro ficarmos sentados aqui?

Quem sabe. Honestamente, não faço ideia.

Tsuga...

Huh? Você me chamou sem honorífico agora?

Acho que você deve ter imaginado...

Eu ouvi, sim. — Tsuga piscou, olhando ao redor. — Lá está de novo.

Pigyaaaaaaaaaahhhhhhh!

Dessa vez, o som foi mais baixo. Isso significava que estava mais longe?

Shihoru suspirou. Ainda era cedo para relaxar, mas pelo menos a ameaça não parecia estar se aproximando.

Escuta, só queria dizer... — Tsuga se levantou e se espreguiçou. — Não estou levando isso na brincadeira. Mas só ficar tenso não ajuda. Se relaxar, você reage melhor e comete menos erros.

Relaxar... Não sou muito boa nisso...

É, isso eu sei. Até dormindo você estava enrolada como uma bolinha.

Por favor, não fique me observando assim do nada.

Eu estava acordado sem nada melhor pra fazer.

Bem... desculpa.

Você não precisa se desculpar por tudo, sabia?

...Não vou mais me desculpar, então.

Tudo bem — disse Tsuga. — Digo, sei que você age humilde assim para evitar ser culpada por qualquer coisa. Pode ser algo inconsciente, claro.

I-Isso foi bem direto...

Se você pensa algo, precisa falar na hora, ou talvez nunca tenha outra chance. Nunca se sentiu assim antes?

Shihoru tentou responder, mas não conseguiu. Apenas suspirou.

Foi então que aconteceu.

De repente, tudo ficou escuro.

Uma sombra. Algo estava passando acima deles. Tinha que ser aquela sombra. Eles também ouviram o som do vento sendo cortado.

Shihoru e Tsuga olharam para cima ao mesmo tempo. Estavam em um espaço aberto pequeno. Tudo ao redor era verde, com árvores, grama e musgo. Verde, verde e mais verde, até onde os olhos alcançavam. O céu estava muito limpo. Nem uma nuvem.

Algo acabou de passar, não foi? — perguntou Shihoru, hesitante.

Provavelmente, sim. — Tsuga pegou sua mochila e levantou o bastão que estava ao seu lado. — Parece perigoso, então vamos dar o fora. Acha que conseguimos?

Ele disse isso como se fosse problema de outra pessoa. Shihoru não quis perder tempo questionando, então se levantou de uma vez. Tsuga parecia indeciso quanto à direção de fuga. Shihoru também estava.

Aparentemente, não havia nada por perto que pudesse servir de proteção contra o que vinha do céu. Talvez as sombras das árvores fossem o melhor esconderijo. Mas mesmo isso...

Ah! — Shihoru segurou firme seu cajado e se abaixou. Se não fizesse isso, seria jogada para longe. Ou derrubada. Ela não fechou os olhos.

Ela viu.

Azul. Era uma criatura azul com asas. Tinha descido do céu de repente. Isso significava que era um pássaro? Ela não sabia. Mas parecia algo além disso.

Grande. Era gigantesca. Seriam pés aquilo? Havia cinco garras curvas na ponta. Aqueles dois pés, quase como mãos, estavam apontados para eles enquanto a criatura se aproximava.

Tsuga segurou o bastão.

Um dragão! — ele gritou, pulando na frente de Shihoru.

Um dragão. Aquilo era um tipo de dragão? Como o dragão de fogo de Darunggar? Se fosse, claramente não tinham chance contra ele.

Pa—!

Hah! — Tsuga brandiu seu bastão com as duas mãos. Ele estava tentando acertar o dragão azul alado que se aproximava?

Seu bastão provavelmente atingiu as patas do dragão em algum lugar. Mas isso não o incomodou. O dragão segurou Tsuga firmemente com a pata direita e passou voando pela direita de Shihoru. Ela quase caiu, mas conseguiu se equilibrar de alguma forma. Quando se virou, viu o dragão pressionando Tsuga contra o chão com sua pata direita, enquanto esticava o pescoço para tentar mordê-lo.

Ahh! Urgh! — Tsuga se debatia desesperadamente. Ainda não havia sido derrotado. Estava vivo.

Dark! — Antes mesmo de pensar: Quero salvá-lo, Shihoru já havia invocado Dark, o elemental. Mesmo sem ordens, Dark assumiu a forma de uma estrela-do-mar e voou em direção ao dragão.

Não, ela percebeu.

Aquilo não era suficiente.

Um pequeno impacto não iria sequer abalar aquele dragão.

Espalhe!

Dark se dividiu em milhares de pedaços. Ele se espalhou, envolvendo a área ao redor do dragão.

Essa era a forma de névoa de Dark. Dark Mist.

O dragão gritou “Pigyahhh!” e ergueu a cabeça, balançando-a violentamente para todos os lados. Isso não seria o bastante para se livrar de Dark. O dragão, de repente incapaz de enxergar, ficou completamente confuso. Falcões, águias e outros pássaros de rapina procuram suas presas de grandes altitudes, confiando em sua excelente visão. Como compensação, acabam dependendo dela. Esse dragão provavelmente era o mesmo. Estava tão desorientado que, sem querer, afrouxou as garras sobre Tsuga. Ele escapou imediatamente.

O dragão gritava “Pigyahhh, Pigyahhhhh”, batendo as asas e andando em círculos, perdido.

Tsuga rastejou e rolou para longe. Quando conseguiu alguma distância, parecia estar se curando com magia de luz. Às vezes, um sacerdote gravemente ferido não conseguia se concentrar o suficiente para lançar magia e acabava incapaz de se curar. Será que Tsuga estava bem? Mesmo preocupada, Shihoru não se deixaria distrair.

Ela focou-se em manter o Dark Mist. Até onde poderia espalhá-lo? Até que ponto poderia movê-lo? Shihoru ainda não compreendia bem essas limitações.

Não. Esse pensamento era um erro.

Era responsabilidade de Shihoru, mas Dark podia se espalhar o quanto ela quisesse. Também podia ser movido.

Não coloque limites, ela disse a si mesma. Eles se tornam restrições.

Ela começou a suar.

Sua visão começou a tremer.

Shihoru rangeu os dentes. Ainda não. Ela podia continuar. Se começasse a pensar que não podia, naquele momento, tudo acabaria.

O dragão começou a correr e bater as asas. Planejava voar?

Desculpa! — gritou Tsuga.

No momento em que ouviu a voz de Tsuga, ela perdeu a concentração. Logo depois, o dragão deu um salto, e o Dark Mist se dispersou e desapareceu instantaneamente.

Vamos sair daqui! — Tsuga segurou seu braço e a puxou.

Shihoru tropeçou e caiu sobre Tsuga. Ele estava coberto de sangue, mas todos os seus ferimentos pareciam curados. Mesmo assim, ele a levantou enquanto começava a correr.

Pois é, essa foi boa. Nunca esperava algo assim... — comentou ele.

Des– — Shihoru estava prestes a se desculpar, mas se segurou e parou no meio da frase. — I-Isso foi perigoso, sabia? Você é tão imprudente!

Você devia ter fugido enquanto eu era comido!

N-Não consigo! Eu não faria algo assim...

Bom, eu ficaria chateado se fizesse. — Tsuga olhou para cima. — Esperava que, depois disso, ele desistisse da gente e nos deixasse ir...

Shihoru não queria olhar para cima. Mas precisava ver com os próprios olhos. Não importava se fosse assustador, e não importava o quanto ela realmente, realmente não quisesse, ela precisava encarar essas coisas por conta própria.

Ela não queria mais deixar isso nas mãos dos outros.




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