Hai to Gensou no Grimgar | Grimgar of Fantasy and Ash Volume 04 Capítulo 12 [Hoje, mais do que Ontem. Amanhã, mais do que Hoje]
— Cara... — murmurou Haruhiro.
Quanto tempo havia se passado desde que o sino das oito horas tocara? Cinco minutos? Dez? Haruhiro não tinha algo caro como um relógio de bolso, então ele não sabia.
— Eles simplesmente não aparecem, né... — ele continuou.
— Não aparecem... — Há um tempo, Mary estava ao lado de Haruhiro, cutucando o chão com seu cajado curto, inquieta.
Haruhiro provavelmente havia chegado ao portão norte por volta das sete e meia. Parecia que Ranta tinha voltado para o alojamento tarde na noite anterior. Quando tentou arrastá-lo para fora da cama, Ranta disse para ir sem ele. Haruhiro não foi chamar Shihoru e Yume. Não achou que fosse necessário.
Ele tinha acordado bastante cedo e, sem ter muito o que fazer, decidiu sair mais cedo do alojamento.
Mary apareceu no portão norte cerca de dez minutos depois de Haruhiro. Claro, ele ficou aliviado ao vê-la.
Que bom, ele pensou, do fundo do coração.
Mary havia aprendido Sacrament. Era uma magia de luz de alto nível que curava ferimentos graves instantaneamente, e poderia ser considerada obrigatória para qualquer sacerdote de nível médio ou superior.
Mary ainda só conseguia usá-la cerca de duas vezes por dia, mas Sacramento certamente seria uma grande vantagem para a party. Se fosse necessário, eles poderiam voltar da beira da morte. Ter esse tipo de carta na manga sem dúvida permitiria que Mary enfrentasse suas batalhas com mais tranquilidade.
Haruhiro havia aprendido outra habilidade com a Barbara-sensei além de Assault: Shatter. Esta era uma habilidade que se encadeava após Swat para atacar o joelho do inimigo. Com duas opções que ele poderia usar após Swat, Arrest e Shatter, isso daria mais variedade aos seus padrões de ataque. Em vez de apenas usar Swat para se defender, ele poderia procurar oportunidades para atacar e, então, finalizar com Assault. Essa era a estratégia que Haruhiro tinha em mente.
Bem, duvido que seja tão fácil, mas cada um de nós precisa expandir o que pode fazer e levar isso o mais longe possível, ele pensou. Se fizermos isso, provavelmente—não, com certeza—encontraremos um caminho a seguir.
Haruhiro estava otimista. Ou, pelo menos, estava tentando ser.
Ele não era um bom líder, mas, mesmo assim, ele era o líder dessa party. Um líder precisava manter a cabeça erguida, avançando um passo, ou até mesmo meio passo de cada vez, ou ninguém o seguiria. Na verdade, se o líder não estivesse avançando, não haveria como alguém segui-lo.
Não era uma questão de poder ou não fazer. Ele tinha que começar apenas fazendo. Nada começaria até que ele desse o primeiro passo. Se nada começasse, não poderia haver resultados. Uma vez que houvesse alguns resultados, ele os aceitaria, usaria como combustível, e avançaria um pouco mais.
No entanto...
— Eles estão muito atrasados... — murmurou Haruhiro.
— Sim... mas... — disse Mary.
— É...
— Talvez eles tenham dormido demais... — ela sugeriu.
— ...Pode ser.
— Eles podem estar cansados de aprender novas habilidades e coisas assim...
— Ahhh — disse Haruhiro. — É, pode ser isso.
— Espero que seja só isso...
— Bem, eu acho que provavelmente é... — Haruhiro disse. — Normalmente... bem, eu também... sabe? Se você me perguntasse se estou totalmente descansado, eu realmente não estou... A Barbara-sensei é bem rigorosa... Há há há... — A risada de Haruhiro soou tão idiota e incrivelmente vazia que ele se sentiu desconfortável.
Droga, isso não é bom, ele pensou. Qual é o problema com essa atmosfera? Essa atmosfera, é—Por quê? Por que eles não estão aparecendo? Como podem estar atrasados num dia tão importante? Tipo, não há como eles estarem, certo? É estranho, sério. Eles não podem se atrasar para isso. Isso é óbvio. Tomem jeito. Ou—pode ser outra coisa?
Tipo, talvez, eles não estejam atrasados?
— Não... Há há há... — Haruhiro riu novamente, tentando afastar a incerteza que surgia dentro dele. Não ajudou em nada; só o fez querer fugir.
Mas ele não fugiu. Ele pareceria um esquisito se fizesse isso.
— Eles simplesmente não aparecem, né... — repetiu Haruhiro.
— Não aparecem... — Mary concordou.
O que eu faço agora? Haruhiro pensou. Mary também está parecendo bem preocupada. Qual é o problema? Sério, o que está acontecendo? Ranta, eu entendo. Ele nem tentou sair da cama esta manhã. Afinal, ele é o Ranta. Mas Shihoru e Yume também, sério? Yume pode não ser tão pontual, mas Shihoru leva as coisas a sério. Ela nunca se atrasou para um encontro antes. Nunca. Esta é a primeira vez. Nesse caso, algo deve estar acontecendo, e é por isso que elas ainda não estão aqui. Essa é a conclusão lógica. Depois do que aconteceu com a gente, e com todos nós assim, agora isso acontece.
— Ah... — murmurou Mary.
Quando ele olhou para ela, Mary estava olhando para o outro lado da rua. Haruhiro também direcionou seu olhar naquela direção. Shihoru, Yume ou Ranta deviam ter chegado.
O que, eles finalmente chegaram? Haruhiro pensou.
Ele estava errado.
Um homem, bastante alto, mas com uma postura ruim, estava caminhando em sua direção. Ele usava uma couraça, manoplas e algumas outras peças de armadura de placas, mas tudo parecia ser de segunda mão. A couraça tinha o hexagrama de Lumiaris gravado nela.
— Oi. — O homem parou na frente de Haruhiro, acenando com a cabeça.
Embora Haruhiro não fosse do tipo que julgava os outros, achou que o cara parecia terrivelmente sombrio. Ele parecia deslocado em uma manhã tão bonita.
— ...Kuzaku — ele disse.
— Por que você...? — Mary olhou para baixo, inquieta, mexendo-se de forma estranha.
Espera, o rosto dela está vermelho? Por quê? Haruhiro pensou. O que? O que aconteceu?
— Ohh. — Kuzaku levou sua grande mão até a testa, coçando a têmpora direita com o dedo mindinho. — Hm. Vamos dizer que aquilo nunca aconteceu.
— Então, nem devia ter dito nada! — explodiu Mary.
— Ah. É, acho que não devia, né — concordou Kuzaku.
— Hã? Hã...? — Haruhiro interrompeu, incapaz de ficar quieto. — O-O que?! Ei, o que está acontecendo, aconteceu alguma coisa...?
— Nada! — Mary estava completamente descontrolada.
— Não, nada não — Kuzaku tinha uma expressão vaga, e era impossível entender o que tudo aquilo poderia significar.
—É, algo aconteceu, Haruhiro pensou. Algo definitivamente aconteceu.
Mas o que seria esse algo? Como esses dois se conhecem? São conhecidos de alguma forma? Kuzaku é nosso calouro, então é difícil imaginar isso. Ainda assim, não posso ter certeza de que não são. Mary sai para beber sozinha à noite, então eles poderiam ter se conhecido em uma dessas vezes? E então, algo aconteceu? Se aconteceu, teria que ser... aquilo...?
Mary estava olhando para baixo e apertando seu cajado. Kuzaku, por outro lado, parecia desconfortável, mas não tanto assim. Tipo, “Não foi realmente grande coisa.” Tipo, “Isso acontece o tempo todo?” Tipo, “Foi uma aventura de uma vez só” ... Aventura...? O que é isso?! Eles... fizeram aquilo?!
Haruhiro deu um tapa e esfregou o próprio peito, piscando repetidamente em confusão.
Certo. Bem, sabe? O que quer que Mary faça, é problema dela, né? Não tenho direito de impedi-la, ou mesmo de me intrometer, não é? Kuzaku é um cara alto, e, por mais sombrio que pareça, o rosto dele não é tão ruim. Se você olhar do jeito certo, ele é até que bonitão. Talvez. Não que eu saiba! Eu não sei se o rosto de um cara é atraente ou não! Não consigo julgar isso! Nem quero! Como se eu me importasse!
—Ok. Já me acalmei. Estou bem agora.
Ele estava calmo. A mente de Haruhiro estava tão fria quanto gelo e tão quieta quanto ficar parado em um lago congelado.
— Então? O que foi? Estava só de passagem? Não é isso, né? — perguntou Haruhiro.
— É, não. Não é isso.
— Bem, então o que é? — Haruhiro exigiu.
— ...Você está meio assustador hoje, sabia?
— Estou? Não acho. E então? Vai responder minha pergunta? — Haruhiro insistiu.
— Estou aqui para pedir um favor de novo, por assim dizer — disse Kuzaku.
— Hã...?
— A party. Estou pedindo para me deixar entrar.
— O quê— — Haruhiro exclamou.
— Você parecia estar dizendo, — Kuzaku continuou — dizendo algo sobre não poder decidir sozinho. Que se os outros estivessem por perto, você poderia perguntar a opinião deles, ou algo assim. Vocês pareciam que iam se reunir em algum lugar.
Ele é irritantemente insistente, pensou Haruhiro. Eu já o recusei, não foi? Eu dei um não bem claro, não dei? Ele disse “Entendi” em resposta, certo? Isso deveria significar “Ok, entendi, vou desistir”, não deveria?
Haruhiro sentiu algo como irritação e hostilidade borbulhando dentro de si, mas deixou que isso ficasse em segundo plano. Não podia simplesmente descarregar tudo no cara daquele jeito. Não seria bom. Ele era o líder. Talvez fosse por ser o líder que ele não podia fazer isso. Não tinha certeza, mas uma voz dentro de Haruhiro ordenava que ele apaziguasse as coisas e mantivesse as aparências.
— ...Eu disse isso, sim — admitiu Haruhiro. — Eu disse isso, mas isso não tem nada a ver com isso.
— Como assim? — perguntou Kuzaku.
— Hã? Bem, sabe... aquilo é aquilo e isto é isto.
— O que é “isto”? — perguntou Kuzaku.
— I-Isto é...
Droga, pensou Haruhiro. Não estou pensando direito. Não estou mantendo as aparências nem um pouco. O que está acontecendo aqui? Estou perdendo a calma? Não posso negar...
— Haruhiro, cara — Kuzaku olhou para Mary. — Você falou com seus colegas sobre mim? Se falou, alguns deles podem ser a favor disso, certo? Eu não saberia, no entanto.
— ...Não, eu não falei — Haruhiro respondeu.
— Eu...! — Mary parecia agitada, mas tossiu para clarear a garganta. — ...T-Talvez eu não... seja realmente a favor disso...
Haruhiro sorriu. — Viu?
— O que você quer dizer com “viu”? — uma voz rude interrompeu.
— Hã?! O que eu quero dizer com— — Haruhiro deu um salto para trás, surpreso. — Uou! Ranta?!
— Não precisa ficar tão surpreso — disse Ranta. — Tem algo de errado com você, cara?
Ranta, pensou Haruhiro. Quando o Ranta chegou e ficou tão perto de mim? Ele está bem ao meu lado. Não, não é apenas o Ranta. Shihoru e Yume também estão aqui. Eles parecem surpresos. Eu sou quem deveria estar surpreso aqui.
— O queeeeé? — Ranta disse, tirando cera dos ouvidos e estreitando os olhos. — Quem é você, cara? Não, eu conheço essa cara. Hm...? Um dos nossos calouros, né? Hã? Cara, você não morreu em Deadhead? É um zumbi?
— Eu ainda estou respirando. Tenho quase certeza de que estou vivo.
— Opa, opa — Ranta disse. — Você tá bem metido pra um dos meus calouros. Quer brigar? Te desafio num mano a mano.
— Não, passo. Não tem motivo pra isso — disse Kuzaku.
— Ho ho — Ranta riu. — Então é assim que você vai ser. É assim que você vai ser, né? Você pode ser um pouquinho mais alto que eu, mas é bom não me olhar de cima, entendeu?
— Pouquinho, é? — Kuzaku disse.
— É mais como muito — Yume disse, comparando a altura de Ranta e Kuzaku. — Ele tem uns vinte centímetros a mais que você, não acha?
— Sua idiota, não pode ser tanto assim! — Ranta bufou. — Onde você tá olhando, sua imbecil?!
— Acho que tenho cerca de 191 ou 192 centímetros — disse Kuzaku.
Shihoru deu uma risadinha. — O Ranta-kun não deve ter nem 171 centímetros. Talvez você tenha mais de 20 centímetros a mais que ele...
— Eu tenho, sim! — Ranta gritou. — Eu tenho facilmente mais de 170 centímetros! Claro que tenho! Tenho mais de 180! E o que esse grandalhão tá fazendo aqui, afinal?!
— Não, antes de chegarmos a isso — Haruhiro olhou para Ranta, Shihoru e Yume, um de cada vez. Todos pareciam relutantes em olhá-lo nos olhos, como se estivessem se sentindo culpados por algo. Era essa a sensação que ele tinha. — Por que... Por que vocês estão tão atrasados? Não combinamos de nos encontrar no portão norte às oito horas? Eu não espero que o Ranta respeite isso, mas vocês duas...
— Sim, sobre isso — Ranta revelou, sem qualquer preocupação, algo que Haruhiro não conseguia acreditar que estava ouvindo. — O lance é que recebi um convite do Renji. Ele estava me perguntando se eu queria me juntar a Equipe Renji.
— Oh... — Haruhiro quase caiu. — Hã...?
— Yume e Shihoru receberam um também, sabia? — disse Yume.
— Também...?
— Elas tavam dizendo que podíamos nos juntar as Wild Angels. A Kajiko-chan tentou recrutar a gente.
— Ka...
Oh, droga. Oh, droga. Oh, droga. Haruhiro sentiu as pernas e tornozelos ficarem fracos. Vou cair. Sério. Não, não cair. Afundar. Nas profundezas do inferno.
— H-Haru...! — Mary se aproximou para apoiá-lo, então ele conseguiu se manter em pé, mas sentia que talvez não fosse capaz de continuar assim. Na verdade, não era um talvez—ele não conseguia.
Para que foi tudo isso? Haruhiro se perguntou. Para que serviram todas as nossas lutas até agora? Por que trabalhamos tão duro? Eles não se importam? Todo o nosso esforço não significa nada? Não importa o quanto nos esforcemos, não podemos fazer algo funcionar se não for para funcionar, é isso? Quer dizer, éramos uma party de rejeitados, afinal de contas.
Não—alguém havia decidido que precisava de Ranta, Shihoru e Yume. Ranta. Esse Ranta. E era Renji, de todas as pessoas. Isso significava que Haruhiro era pior do que Ranta. Significava que Haruhiro era o verdadeiro rejeitado.
Mary, também. Mas Mary era uma sacerdotisa. Se ela apenas mantivesse a boca fechada, alguém a chamaria para se juntar a eles. Havia uma diferença esmagadora no nível de demanda para um ladrão e para um sacerdote.
O futuro de Haruhiro parecia sombrio. Não havia nada além de escuridão total. Ele estava na escuridão.
— Whoa... — Kuzaku olhou para eles, franzindo a testa. — Parece que vocês têm outros problemas antes de decidir se vão me deixar entrar.
Ele está certo, pensou Haruhiro. Ele está tão malditamente certo. Eu não tenho tempo para ele.
— ...Desculpa. Obrigado, Mary. — Haruhiro se afastou de Mary, respirando fundo, bem fundo.
E agora? ele pensou. O que vou fazer? Daqui em diante. Preciso pensar no que vou fazer comigo mesmo. Eu sei. Nunca fui material para ser um soldado voluntário, então talvez eu devesse aprender um ofício. Encontrar alguém disposto a me aceitar como aprendiz. Parece um trabalho duro, e duvido que eu consiga lidar com negócios. Mas, se eu trabalhar diligentemente, talvez dê certo. Não é como se eu fosse morrer se errar, então é mais fácil. Mais fácil do que isso.
— Hã? Você quer se juntar? — Ranta olhou Kuzaku de cima a baixo, dos pés à cabeça. — Um paladino, hein. Entendo.
— Ohh. — Por algum motivo, Yume deu tapas nos braços e ombros de Kuzaku, como se estivesse testando o quão fortes eram. — O que faz um “pallydin”?
— ...Bem, luta com uma espada e tal... — Kuzaku estava surpreso. — Além disso, podemos usar magia de luz, então podemos fazer um pouco de cura. Não podemos nos curar, no entanto. Fora isso, podemos nos defender com um escudo.
— Eles podem fazer um monte de maracutaia, né — Yume disse.
— Um monte de... maracutaia? Bem... não sei sobre isso — disse Kuzaku. — Não acho que seja assim.
— ...Basicamente, você é um tanque... certo? — Shihoru perguntou hesitante.
Kuzaku deu um aceno vago. — É, algo assim.
— Você não é muito claro sobre isso! — Ranta disse, zombando. — Se você quer entrar na nossa party, precisa ser claro sobre isso. Como vamos decidir de outra forma?
— Hã...? — Mary piscou repetidamente, seus olhos se movendo de uma pessoa para outra.
A cabeça de Haruhiro ainda estava confusa, então ele pensou que algo estava estranho, mas não tinha certeza do quê.
— Hm? — Ranta lançou um olhar suspeito para Haruhiro. — O que? Você está agindo de maneira muito estranha. Tá me assustando, cara.
— ...Não, não sei o que é, mas... Não quero que você, de todas as pessoas, me chame de esquisito — disse Haruhiro.
— Só estou dizendo que você está agindo estranho porque está — disse Ranta. — Se não quer ser chamado de esquisito, então não seja esquisito.
— O que é esquisito é uma questão de perspectiva. Isso é só a sua—Não, não é isso! — Haruhiro explodiu.
— O quê? — Ranta perguntou.
— Ahhhh?! Não, eu quero dizer, Renji... ele te convidou para se juntar a ele, certo? E Kajiko fez o mesmo com Shihoru e Yume. Se vocês estavam todos atrasados por causa disso, isso deve significar...
— Desculpa por isso — disse Yume.
Eu sabia, Haruhiro não pôde deixar de pensar. O que mais havia para pensar? Veja.
Olha, é assim: eu achava que estava pronto para isso, então pensei que ficaria bem. Mas na verdade, eu não estou preparado e não estou nada bem!
— Pra dizer a verdade, quando a Kajiko-chan me convidou, Yume realmente não sabia o que fazer — disse Yume.
— Imagino — Haruhiro disse com um sorriso forçado. — Quer dizer, é a Kajiko. Ela é famosa.
— ...Ela foi muito gentil — disse Shihoru, encolhendo-se. — ...Ela foi atenciosa, e nos contou várias coisas. As condições eram boas também...
— Quanto a mim, Renji disse que eu seria útil, sabe? Ele nem me chamou de Cacheado, ele me chamou pelo nome! “Ranta”... — disse Ranta, abaixando a voz. Ele pode ter tentado imitar Renji, mas parecia apenas que estava fazendo uma careta engraçada. — “Você vai se tornar útil”, ele disse! Gahahahahahahahah! Pessoas que entendem, realmente entendem! Meu talento brilhante, é claro!
— Imagino — Haruhiro estreitou os olhos. — Imagino. Sim. Nunca consegui te usar direito. É, deve ser isso...
— Sim — Ranta concordou. — Renji estava dizendo isso também. Ele disse que você não seria capaz de me usar direito.
— ...Entendo. — Haruhiro rangeu os dentes. Se Renji, o cara que rapidamente reuniu pessoas que podia usar, formou a Equipe Renji, e seguiu direto pelo caminho para o estrelato, foi quem disse isso, Haruhiro não podia argumentar. Haruhiro não tinha aptidão para liderança. Ele sabia disso tão bem que doía. Era óbvio.
— Então, sendo esse o caso, eu tive que realmente quebrar a cabeça sobre o que eu ia fazer, sabe — disse Ranta, cutucando Haruhiro de leve—não, na verdade, com força, no ombro. — É melhor você ser grato, Parupiroooo!
— Ai—espera, hã? Grato? Pelo quê?
— Hãhh? Por mim! Ranta-sama! Eu decidi ficar com vocês, cara! — Ranta gritou. — Você deveria estar tão agradecido que chorasse, tipo, uns três litros de lágrimas!
— Hã? — Haruhiro disse, atordoado.
— Yume e Shihoru também — disse Yume, esfregando as bochechas. — A gente pensou muuuuito sobre isso, sabe. Conversando juntas. Yume, sinceramente, não estava tão confiante em continuar assim. Ela estava preocupada que pudesse acabar causando problemas para todo mundo. Yume estava com medo. Até esta manhã, ela não sabia o que ia fazer.
— Quanto a mim, eu não conseguia decidir nada sozinha... — Shihoru puxou o chapéu de maga para baixo. — Achei que isso era patético da minha parte. Pode ser que não haja lugar para mim... talvez as pessoas fiquem melhores sem mim... Foi o que comecei a pensar. Me perguntei se eu poderia apoiar a todos... Se eu fosse continuar nesta party, sabia que tinha que estar preparada para fazer pelo menos isso... E se eu me juntasse a uma party mais forte, a vida poderia ser mais fácil...
— Poderia ser, sim, mas Yume e Shihoru tomaram uma decisão — Yume disse, cerrando os punhos. — Ficar nesta party onde Manato esteve, onde Moguzo esteve, e onde Haru-kun e todo mundo ainda estão. Yume e Shihoru queriam fugir. Tem sido doloroso, sabe. Mas, se Yume fugisse, sabia que se arrependeria depois, e, na verdade—Yume não quer deixar todo mundo.
— O-Q-Que história é essa? — Ranta estava ligeiramente corado. — Apesar de como você normalmente age, você sente isso tão profundamente, hein? Sobre mim...
— Claro, Ranta, você é só um extra que vem com todo o pacote — Yume acrescentou.
— Quem você tá chamando de extra, sua idiota?! Eu vou apertar sua bunda e esmagá-la, sua imbecil!
— Tarado! — Yume retrucou. — Você vale menos do que um extra indesejado! Você é pior que lixo!
Yume e Ranta voltaram à sua habitual troca de provocações.
Haruhiro olhou para Mary. Mary ainda parecia atordoada, como se não pudesse acreditar. Haruhiro provavelmente estava com a mesma expressão.
— Hum... — Shihoru inclinou a cabeça vigorosamente, inclinando-se tanto para frente que parecia estar curvada, e seu chapéu caiu no chão. Shihoru rapidamente o pegou e o colocou de volta, depois se curvou novamente. — ...Desculpa. Por ser indecisa. Mas... Eu não queria mentir. Se eu não tivesse sido clara sobre as coisas, algum dia isso definitivamente teria criado uma ruptura, podemos dizer... ou algo ruim teria acontecido, eu pensei. Se eu não tivesse exposto tudo... incluindo minha fraqueza, eu não acho que poderia seguir em frente...
— Hmph. — Ranta bufou e cruzou os braços, olhando para o lado. — Se você tem uma chance de dar o próximo passo na sua frente, é natural querer aproveitá-la. Por que você está se desculpando?
Haruhiro inclinou a cabeça para o lado. — ...Bem, então por que você abriu mão dessa chance? Se você quisesse, poderia ter entrado na party do Renji.
— Eu fiz isso para dar o próximo passo. Não é óbvio?
— Eu não entendo muito bem... — Haruhiro disse.
— O quê, você não entende? É por isso que você é um idiota — disse Ranta. — Agora, ouça. Se alguém se oferece para me puxar para cima, e eu sigo junto porque eles mandaram, isso não significa nada. Para mim, isso não é progresso nem nada parecido. Subir até o topo usando a minha própria força, isso é o que torna as coisas interessantes. É o que eu chamo de dar um passo adiante. É a única maneira verdadeira de fazer isso. Entendeu?
— ...Vagamente? — Haruhiro disse.
— Não entenda só vagamente, entenda completamente! Além disso, não me importa se é o Renji, o Kenji ou o Gejigeji, mas é muito presunçoso da parte dele achar que pode me levantar. Se alguém vai fazer isso, sou eu. Então, basicamente, estou dizendo que vou elevar vocês a um nível ou dois! Tente não fazer nada que me envergonhe enquanto estou nisso! Esse é o seu dever! Quero ouvir sua resposta! Sim ou sim?!
— Sim ou sim...? — Yume perguntou, inflando as bochechas e fazendo beicinho. — Se você diz assim, os dois são a mesma coisa, não são?
— Sim, essa é meio que a ideia!
— ...Erm — Kuzaku apontou para si mesmo. — E eu?
— Quem liga! — Ranta fez um gesto como se estivesse virando uma lata de lixo. — Eu não dou a mínima para o que acontece com um brutamontes como você!
— Um paladino, hein — Yume franziu as sobrancelhas. — Hrm...
— ...É meio repentino... — Shihoru disse, tentando não olhar para Kuzaku.
Ranta poderia estar nutrindo um ressentimento sem fundamento contra ele por causa da diferença de altura. Yume e Shihoru não souberam como reagir quando isso foi mencionado tão de repente. Mary não parecia muito entusiasmada com a ideia por causa de algo que havia acontecido entre eles, e Haruhiro não queria complicar as coisas agora que tinham acabado de resolver tudo.
— Kuzaku — disse Haruhiro. — Sinto muito, mas eu realmente não posso—
— Por favor. — Kuzaku se curvou muito, muito profundamente. Quando ele colocou as mãos nos joelhos, inclinando-se para frente mais de 90 graus, foi algo muito intenso.
— Por favor. Não estou pedindo isso com sentimentos meia-boca. Estou falando sério. Do meu jeito.
— Bem, é claro que está — Ranta zombou. — Todos temos que ganhar a vida de alguma forma. Mas você não pode fazer isso sozinho. Estamos sem um tanque agora, e somos os mais fracos entre os fracos. Se alguém vai te aceitar, seria a gente, é isso?
— ...Não é isso — disse Kuzaku.
— Então, o que é? — Ranta exigiu.
— Eu quero me juntar a vocês — Kuzaku levantou apenas o rosto, olhando para Haruhiro com olhos suplicantes. — Eu estava vendo vocês em Deadhead. Para ser sincero, não achei que fossem tão fortes, parecia que não eram confiáveis. Mesmo assim, vocês nos ajudaram e no final estavam lutando na linha de frente. Eu, eu quase morri, então minhas lembranças são confusas, mas consegui ouvir algumas coisas. As vozes de vocês, por exemplo. Eu achei que vocês eram incríveis. Seria mais fácil de entender se parecessem fortes, mas mesmo sem parecer, conseguiram lutar bem. Achei isso legal. Pensei que ia morrer ali e fiquei pensando que gostaria de ter sido como vocês. “Por que fui tão irresponsável e negligente? Queria ter levado as coisas mais a sério”. Foi isso que pensei. Enquanto ouvia as vozes de vocês. Eu deveria ter morrido. Mas, quando me dei conta, estava vivo. Todos os meus companheiros estavam mortos, mas eu era o único que ainda estava vivo.
Haruhiro não conseguia desviar o olhar dele.
Droga, pensou. Esse cara está falando sério.
Ele estava expondo seus sentimentos sinceros para Haruhiro e os outros. Haruhiro não podia simplesmente ignorar isso. Se fosse rejeitá-lo, precisaria de uma razão adequada e justificada, da qual se sentisse realmente convicto.
Haruhiro se perguntou se tinha um motivo realmente bom para mandar Kuzaku embora.
Se ele dissesse que simplesmente não gostava dele ou que era muito cedo depois da perda de Moguzo, será que Kuzaku aceitaria isso? Haruhiro conseguiria se convencer de que estava tudo bem em fazer isso?
— Eu sou legal, né? — Ranta passou a mão pelo cabelo encaracolado e abriu um sorriso. Ele não se incomodou com o elogio—na verdade, parecia estar se sentindo muito bem com isso. — De certa forma, acho que sou mesmo. Mas, sendo sincero, ouvir a verdade nua e crua assim não me deixa muito feliz, sabe? Mas, se você consegue reconhecer a minha genialidade, você tem um baita potencial.
— Não. Eu não estava falando só de você, estava falando de todo mundo — corrigiu Kuzaku.
— Não me contradiga! Você devia concordar! É óbvio que isso é melhor para os dois lados!
— Um tanque de verdade — Shihoru falou hesitante — é algo de que precisamos, acho.
— É — Yume cruzou os braços e assentiu repetidamente. — Se Ranta for o tanque, vai ser uma bagunça. Temos que fazer algo sobre isso.
Haruhiro olhou para Mary para avaliar sua reação. — ...Mary?
Mary franziu a testa e mordeu levemente o canto da boca. — Se a party precisar. Não me importo muito.
— Maaas! — Ranta apontou um dedo para Kuzaku. — É só temporário por enquanto! Temporário! Durante o período de experiência, se você não estiver no nosso nível, ou não conseguir acompanhar o resto de nós, ou não entender minhas piadas sofisticadas, ou não me adorar, ou não me pagar tributos, ou se qualquer problema surgir que não possa ser resolvido, você está fora! Fora! Entendeu?
— Não decida as coisas por conta própria... — murmurou Haruhiro.
— Cala a boca, Haruhiro! — Ranta gritou. — Eu estou tomando as decisões porque você não tem coragem! Você precisa ser mais decisivo daqui em diante, ou eu não vou hesitar em assumir o comando! É melhor se preparar para isso!
— Isso não pode acontecer! — Yume se agarrou a Haruhiro. — Haru-kun, se controla! Se o Ranta fizer o que quiser, vai ser horrível! Yume não vai suportar isso!
Shihoru levantou a mão. — ...Eu também não.
Mary estava concordando com a cabeça.
— O que há de errado com todos vocês?! — Ranta gritou, cuspindo saliva por todo lado. — Estou fazendo isso para que esse indeciso, hesitante e inútil assuma a responsabilidade!
— Eu sei — disse Haruhiro, coçando o queixo. — Eu entendo, cara.
— ...Você entende? — gaguejou Ranta. — Se entende, bem, então—
— Há muitos problemas na forma como você está dizendo isso — Haruhiro disse. — Mas, no seu caso, você já tem uma personalidade difícil, então acho que não adianta reclamar.
— Ah, cala a boca! — Ranta gritou. — Fica quieto! Sério! Sério!
— Kuzaku — disse Haruhiro.
Quando Haruhiro ignorou o barulhento Ranta e chamou seu nome, Kuzaku ainda estava curvado e olhando para ele.
Talvez ele seja um cara surpreendentemente decente, pensou Haruhiro. Não posso afirmar nada com certeza. Embora eu ache que é normal não saber. Eu vou descobrir daqui em diante. Se estivermos trabalhando juntos, com o tempo, vou começar a perceber isso. —Isso vale para o que aconteceu com Mary também. Não, eu não me importo com isso. Preciso separar o trabalho das vidas pessoais.
— Não vou colocar você em período de experiência, como o Ranta sugeriu, mas não espero que você se encaixe perfeitamente logo de cara — disse Haruhiro. — Você é um paladino, e vamos fazer você atuar como o tanque, então você vai carregar muito do peso. Vai ser difícil, com certeza. Pode ser que você descubra que não está à altura. Ainda assim, você está de acordo com isso?
— Sim, isso é o suficiente — respondeu Kuzaku.
— Certo. Bem-vindo a party, então.
Quando Haruhiro lhe ofereceu a mão direita, Kuzaku finalmente se levantou e apertou sua mão.
Para alguém tão grande e ossudo, a mão dele é macia, pensou Haruhiro. Seu aperto não é tão firme, então ele parece meio inseguro. Não é muito como um tanque deveria ser. Será que vai dar certo?
Além disso, mesmo depois que Haruhiro já havia afrouxado o aperto, por alguma razão Kuzaku não estava soltando sua mão.
— ...Hum — disse Haruhiro. — Você pode soltar agora?
— Ah — disse Kuzaku. — Foi mal.
— Não, não é nada demais...
— Certo! — Ranta apontou para o norte. — Agora que isso está resolvido, vamos partir! Pensando bem, nós nunca decidimos para onde ir, não é?! Eu tenho uma ideia! Novos campos de caça, perfeitos para entrar em um novo clima enquanto começamos hoje de novo! É o novo mundo dos espíritos caçadores!
Yume inclinou a cabeça para o lado. — novomundodospírituscaçadores...?
— ...Y-Yume... — Shihoru puxou o braço de Yume.
— Hã? Shihoru, o que foi?
— ...Não é nada, é só...
— Onde é isso? — perguntou Kuzaku, parecendo cansado.
Ranta riu e disse: — Escuta e tenta não ficar surpreso! É o Buraco das Maravilhas!
Se gostou do capítulo, compartilhe e deixe seu comentário!